Licença para beber


MARCO MERGUIZZO – Para quem é fã de drinques, o cinema sempre foi uma fonte inesgotável e sedutora de referências etílicas. Clássico das telonas, os filmes do agente secreto 007 – personagem fictício inventado pelo escritor inglês Ian Fleming (1908-1964) e imortalizado nas telonas durante a Guerra Fria, entre os anos 50, pós-segunda Grande Guerra Mundial, e 80 do século passado, com o fim da ex-União Soviética e a queda do muro de Berlim – tinha uma vasta predileção quando o tema, independentemente de sua missão ou inimigo da vez, passava pelo bar.

A preferência do célebre espião recaia do modo impreterível sobre uma flûte de champanhe Grug,  o clássico Dry Martini ou, ainda, uma variação deste, o Vesper Martini, cuja criação teria sido do próprio personagem.

Embora o escocês fenomenal Sean Connery (1930-2020) e outros atores menos espetaculares de 007 tenham empunhado em suas taças tais bebidas, é a receita deste última e o passo a passo de como prepará-la, descrita no primeiro livro da saga de Fleming, Casino Royale – lançado em 1953 e adaptado em 2006 pelo diretor Martin Campbell -, que James Bond, interpretado na película pelo ator britânico Daniel Craig, eternizou-a através deste diálogo transcorrido no bar do hotel Splendid, em Montenegro:

Sean Connery: o maior e mais espetacular dos espiões da Rainha

“ – Um dry Martini, sim? – disse Bond ao barman. Em um cálice fundo de champanhe, por favor.

– Oui, monsieur.

– Espere. Use três medidas de Gordon’s, uma de vodca e meia medida de Kina Lillet. Agite até ficar bem gelado, depois acrescente uma casca de limão bem fina e comprida. Entendeu?

– Certamente, monsieur. Puxa, isso é o que eu chamo de drinque!

Bond sorriu para logo em seguida comentar:

– Fui eu que o inventei. Gosto dele forte, gelado e muito bem feito. Vou patenteá-lo assim que eu pensar em um bom nome.

(Curta no final deste post o vídeo da cena de preparação do drinque no remake Casino Royale, de 2006).

Na sequência da trama, Bond batiza-o de Vesper em homenagem à primeira de suas muitas e avassaladoras conquistas românticas: a femme fatale Vesper Lynd, interpretada em Casino Royale, de 2006, pela estonteante atriz e modelo francesa Eva Green (Fotos: Arquivo)

Néctar licoroso

Criado e lançado em 1895 por Lillet Frerés, fabricante francês de licores e fortificantes de Podensac, de Gironde, região situada no sudoeste francês, o Kina Lillet, nome com o qual foi originalmente lançado, era um vermute doce com passagem em barricas de carvalho, elaborado à base de vinhos bordaleses, licor de laranjas e extrato de cascas da árvore sul-americana Cinchona officinalis, nome científico da Quinquina ou Kina-kina do Peru – daí a origem de seu nome de batismo –, mergulhadas em álcool para macerar.

É dessa planta que provém o quinino, substância de propriedades medicinais usada no passado no tratamento da malária e como relaxante muscular, e que empresta o toque amargo a este vinho licoroso de paladar exótico e refrescante.

Ao lado do absinto, destilado de um verde profundo feito a partir da planta Artemisia absinthium, bebida emblemática dos chamados “Les Poètes Maudits” do simbolismo francês, como Paulo Verlaine (1844-1896) e Arthur Rimbaud (1854-1891), o Kinna Lillet virou moda nos cafés parisienses nos inícios da Belle Époque, tornando-se conhecido à época como “o aperitivo de Bordeaux” por excelência.

Na nova versão, mais licorosa, o paladar se tornou mais frutado, com ênfase às notas de laranja, e portanto menos amarga, já que o teor de quinino ficou infinitamente menor.  Ou seja, podia ser tomado puro, gelado ou ainda integrar outros drinques.

Mas diferentemente da “La Fée Verte” (A Fada Verde) e de seus vertiginosos 70 graus alcoólicos, a venda do Kina Lillet nunca foi proibida. Para agradar ao paladar dos britânicos que o apreciavam ultragelado, misturado ao gim, a receita da bebida seria alterada e, a seguir, rebatizada nos anos 1920 como Amis Lillet Sec.

O Lillet embalava as festas de arromba da high society europeia dos anos 50

A americana Bessie Wallis Warfield (1896-1986), a duquesa de Windsor, conhecida por promover grandes festas nas rodas da alta sociedade parisiense e londrina, e cuja notoriedade, além do sangue nobre, era ser amante do rei Eduard VIII, de Gales, foi uma das grandes divulgadoras do Lillet nos anos 50 do século passado.

À mesma época, o aperitivo francês atravessaria o Atlântico para desembarcar no mercado norte-americano, o maior e mais disputado do mundo. Resultado: rapidamente, viraria o aperitivo da moda em bares de Nova York, ao entrar na composição de drinques como o caribenho Mojito, conquistando a ex-primeira-dama Jacqueline Kennedy (1929-1994), entre outros fãs ilustres, e, a seguir, popularizando-se no país do Tio Sam até mais que no Velho Mundo.

Uma bebida, enfim, sedutora, refrescante, camaleônica e que de quebra carrega a aura e o charme de um certo Bond. James Bond.


LILLET NO BRASIL: ULALÁ!…

Trazido pela Single Brands/Pernod Ricard, o clássico vermute francês com quase 150 anos de história acaba de desembarcar no Brasil

Exclusividade da pequena Podensac, situada na região sul de Bordeaux, o Lillet agora pode ser encontrado aqui no Brasil. Importado pela Pernod Ricard/Single Brands, o lançamento oficial ocorreu em São Paulo, em meados de novembro de 2018, e passou a figurar nas cartas de um seleto grupo de bares e restaurantes da cidade, como os elegantes Baretto e Londra do grupo Fasano, o cool Frank Bar, além dos tradicionais Chef Rouge e Esther Rooftop e da recém-aberta filial paulistana do Nobu de NY, entre outros.

Mescla de vinhos feitos com as variedades brancas Sauvignon Blanc, Semillon e Muscadelle (ou Moscatel) com frutas selecionadas e maceradas (caso de laranjas doces e amargas provenientes da Espanha e Turquia) mais quinino, este tradicional e típico vermute francês fica meses em barris de carvalho bordaleses para ganhar suavidade e um sabor frutado peculiar e balanceado.

O Lillet pode ser saboreado de maneira clássica, com bastante gelo, tônica e uma rodela de laranja mas também pode figurar como ingrediente sob a forma de drinque, caso do Vesper Martini. Ou seja: bebida democrática, original e instigante, é uma dica certeira para celebrar as festas de fim de ano e refrescar o paladar naqueles dias quentes de verão que se avizinham. 

Para mais informações, acesse: @Lillet.br

Preço: R$ 119,90

Para ver e saborear:

Casino Royale (1953) com Sean Connery
Casino Royale (2006) com Daniel Graig

MARCO MERGUIZZO é
jornalista profissional
especializado em
gastronomia, vinhos,
viagens
e outras
coisas boas da vida.
Escreve neste coletivo
toda segunda-feira.
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no Instagram, acessando
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