
MARCO MERGUIZZO – Bebida aromática e cheia de sabor, o café quando associado ao chocolate e a outras bebidas como aguardentes, uísques e licores de boa qualidade pode ser uma dica perfeita para aquecer o paladar nestes dias e noites de inverno, nos quais a temperatura despenca. Caso de Sorocaba e região, cujas mínimas oscilarão entre 4º e 17º C, a partir deste final de semana. De acordo com o Climatempo, as madrugadas prometem ser as mais geladas do ano, batendo os 3 graus e sensação térmica de zero, com possibilidade de geadas.
O negócio é reforçar cobertores, para aquecer o corpo, e a taça e xícaras, para esquentar o paladar. Como se sabe, o hábito de beber café é um prazer milenar hoje globalizado e cultuado em todos os cantos do planeta. Sorvido no dia a dia, o cafezinho vai bem a qualquer hora: logo de manhã ao despertar, no final das refeições, para fechar o dia – mas, sobretudo, agora, na estação mais gelada do ano, quando ajuda a espantar o frio.
Diz a lenda que no século 9, um pastor etíope de nome Khaldi involuntariamente descobriu as propriedades energizantes contidas na cafeína. Ao apascentar as suas cabras, Khaldi percebeu que elas se assanhavam ao mordiscar as frutinhas vermelhas e docinhas nascidas do pé da Coffea arabica.
Instantaneamente, as frutinhas se tornariam itens indispensáveis à mesa dos militares árabes e otomanos, que com elas elaboravam infusões estimulantes para mantê-los acordados e sempre alertas durante as vigílias noturnas. Então, faziam-se as infusões com as frutinhas cruas ou meramente desidratadas.
Consta que, por volta de século 12, na cidade sagrada de Meca teriam surgido as primeiras cafeterias, denominadas de kaveh kanes, na verdade, centros religiosos de adoração a Alá. Durante as sessões de meditação dos fiéis de Maomé, como o álcool era terminantemente proibido, eram servidas uma infusão de nome qahawah, cujo significado é força, termo de onde se derivou etimologicamente a palavra kahve, kaffe e por fim, o café.

Foi assim que o “santo cafezinho” se tornou uma espécie de “vinho do Islã”. O efeito estimulante da cafeína agradou tanto aos muçulmanos que o seu consumo se disseminou pelo Oriente Médio, migrando por toda a península Arábica. Apenas no século 14, porém, o mundo conheceu as propriedades do café torrado – e novamente quase que por acidente.
Durante uma investida na Europa, os árabes cercaram Viena, a capital austríaca. Como se tornara um hábito, levaram sacas e mais sacas de café para o seu consumo diário. Ao sofrerem um contra-ataque, os árabes recuaram e, na sua pressa, decidiram queimar seus suprimentos, incluindo as frutinhas vermelhas. Desse imprevisto teria nascido a infusão como a conhecemos hoje.
A mística “bebida das Arábias” foi conquistar definitivamente a Europa pelas mãos dos comerciantes italianos da cidade portuária de Veneza. Mas só virou moda entre os europeus depois da segunda metade do século 17. Foi a partir dessa época que o hábito de beber café começou a ser associado a encontros sociais, à música e a outras manifestações artísticas que aconteciam nas festivas botteghes del caffe venezianas.
SABOR ITALIANO NASCIDO NOS MOSTEIROS DA IDADE MÉDIA


Coube também aos italianos a inspiração de combinar a já apreciada infusão a um álcool. Por volta de 1530, uma bella giovane donna da comuna lombarda de Saronno, modelo do pintor Bernardino Luini (1480-1532), homenageou o seu mestre com uma bebida singular, uma mistura de café e de um gole do licor de amêndoas da cidade. Nascia, assim, o caffè all’Amaretto.
Destilado com sabor inconfundível, o Amaretto surgiu, como outros alimentos e bebidas fermentadas e destiladas, em mosteiros medievais. Desse modo, Luini, que era companheiro artístico de Leonardo da Vinci, teria sido o primeiro a saborear a nova invenção etílica criada para homenagear uma bela mulher.
A ideia de mesclar o café a um álcool vingou e se espalhou pelo Velho Continente. Vale lembrar que, em várias regiões e países europeus, reproduziram-se versões inspiradas no café Amaretto. Caso da grappa e da sambuca italianas. Da bagaceira portuguesa. Coube também aos italianos a inspiração de combinar a já apreciada infusão a um álcool.
Por volta de 1530, uma bella giovane donna da comuna lombarda de Saronno, modelo do pintor Bernardino Luini (1480-1532), homenageou o seu mestre com uma bebida singular, uma mistura de café e de um gole do licor de amêndoas da cidade. Nascia, assim, o café Amaretto.

Destilado com sabor inconfundível, o Amaretto surgiu, como outros alimentos e bebidas fermentadas e destiladas, em mosteiros medievais. Desse modo, Luini, que era companheiro artístico de Leonardo da Vinci, teria sido o primeiro a saborear a nova invenção etílica criada para homenagear uma bela mulher.
A ideia de mesclar o café a um álcool vingou e se espalhou pelo Velho Continente. Vale lembrar que, em várias regiões e países europeus, reproduziram-se versões inspiradas no Café Amaretto. Caso da grappa e da sambuca italianas. Da bagaceira portuguesa.
Da acquavit dos países esncadinavos. Do uísque da Escócia e da Irlanda. Todos eles, associados ao sabor de um revigorante e aromático cafezinho, viraram criações perfeitas para espantar o frio e enfrentar as baixas temperaturas do Hemisfério Norte.
Outra versão sobre a origem deste hot drink é a registrada nos livros de coquetelaria, que garante que o Café Amaretto ou Souper Coffee, nome com o qual ele é conhecido na terra do Tio Sam, teria nascido em meio à neve e às pistas de esqui do Colorado, no bar Souper, em Aspen, na primeira metade do século passado.
AQUECENDO O PALADAR À MODA IRLANDESA

De sabor marcante e cheio de calor, o Irish Coffee, outro clássico da coquetelaria mundial, só ganhou fama no século 20. Assim como a origem de um de seus ingredientes básicos – o autêntico uísque irlandês -, a tradição deste drinque vem do país dos antigos celtas. Ao lado dos escoceses, os irlandeses reivindicam para si a primazia da invenção do scotch whisky.
A história mais difundida é a de que a arte de destilar o uísgue beatha, que, em gaélico, significa “água da vida”, teria surgido na Irlanda do século 5 e, depois, emigrado para os mosteiros escoceses. Sabe-se, porém, graças a documentos oficiais, que a arte milenar de destilar já era praticada tanto pelos celtas irlandeses quanto escoceses, antes de a técnica chegar às mãos dos missionários cristãos.
Não há, todavia, nenhum registro mais preciso quanto à verdadeira origem do Irish Coffee. Sabe-se, contudo, que esta beberagem de identidade e tradição irlandesas despontou para a fama numa gélida noite de San Francisco, na costa oeste americana, nos anos de 1950.
A receita deste hot drink foi resgatada pelo colunista de turismo do jornal Iate Chronicle, o jornalista Stanton Delaplane, assíduo frequentador do Buena Vista Café. Reproduzida com perfeição pelo barman da casa, a fórmula se consagraria nos EUA e no resto do mundo, graças à harmonia de sua composição e, é claro, com uma certa mãozinha dos produtores de uísque irlandês, que passaram a divulgar o drinque e a recomendá-lo.
O PREFERIDO DOS ILUMINISTAS E DA ARISTOCRACIA VIENENSE

Outro clássico para esquentar o paladar e aquecer o espirito é o Café Vienense. Nascida e desenvolvida na capital da Áustria, na segunda metade do século 17, esta deliciosa preparação é a única que não inclui bebida alcoólica em sua receita original. Os austríacos, os seus inventores, foram os que primeiro aprimoraram a arte de preparar e beber café, adoçando-o e aromatizando-o com mel, tendo mais esse mérito gastronômico.
Segundo registros históricos, após uma frustrada tentativa de conquista de Viena, os turcos acabaram abandonando várias sacas de café às portas da cidade. Tudo foi prontamente aproveitado, dando início ao café preparado na hora, servido fumegante.
Um brinde a Bach

À época, o entusiasmo pela infusão tinha se apoderado de quase toda a Europa quando a bebida chegou à Alemanha. Assim como o povo germânico que havia aderido aos modismos e ao gosto dos franceses pelos costumes exóticos trazidos da Turquia, o genial compositor de Leipzig, Johann Sebastian Bach (1685-1750), sucumbira igualmente à cafemania daqueles idos.
Para demonstrar sua paixão pela bebida, Bach compôs a Coffea Cantata BWV 211 (ouça e se deleite com um pequeno trecho, assistindo ao vídeo, logo abaixo). Mas, ao contrário da produção e do rigor musical da época ligada sempre a temas religiosos, optou por compor uma cantata profana, eternizando o grão numa bela homenagem.
Em 1732, para completar esta sua obra única, encomendou ao poeta Picander um texto burlesco que narra a história do maestro Schlendrian, cuja filha Lieschen tem uma irresistível predileção por café. Preocupado com o consumo exagerado por parte da moça, o pai resolve casá-la e, assim, afastá-la da bebida.
Um brinde à Bach! Claro, com um irresistível e aromático cafezinho tirado na hora…
PARA FAZER E SABOREAR EM CASA
IRISH COFFEE

INGREDIENTES
3/10 de uísque irlandês. 2/10 de creme de leite batido. 5/10 de café quente. 1 colher (bar) de açúcar.
PREPARO
1) Aqueça previamente um copo (ou caneca de café) especial para drinques quentes. 2) Monte diretamente no copo, misturando o uísque, o café e o açúcar. 3) Coloque o creme de leite batido por cima, deitando-o sobre as costas de uma colher de bar aquecida (não misture novamente).
CAFÉ VIENENSE

INGREDIENTES
4 pedacinhos de chocolate meio-amargo. 4 colheres (sopa) de creme de leite. 4 xícaras de café bem forte. Açúcar a gosto. Chantilly, canela, cacau ou raspas de laranja, conforme a preferência.
PREPARO
1) Derreta o chocolate, o açúcar e o creme em fogo brando. 2) Junte o café bem quente e leve ao fogo sem deixar ferver. 3) Coloque em xícaras grandes 4) Guarneça com chantilly e, sobre ele, coloque a canela e o cacau em pó, ou as raspas de laranja, em pequena quantidade, e sirva.
CAFÉ AMARETTO

INGREDIENTES
½ dose de licor de Amaretto. ½ dose de licor de café (Tia Maria, Kahlua ou similar). 1 xícara de café bem quente. Uma porção generosa de creme chantilly. 1 morango com folhinhas verdes para decorar.
PREPARO
1) Coloque os licores em uma xícara de café grande ou em outro copo especial. 2) Cubra com o creme chantilly. 3) Acrescente a decoração e sirva imediatamente.
MELHOR HORA PARA SABOREAR
Todos os drinques podem ser saboreados, a qualquer hora do dia ou da noite, quando o frio apertar. À mesa, o Café Amaretto é perfeito para finalizar um jantar, o que não ocorre com os demais, já que são preparações mais encorpadas.
BISCOITINHOS E OUTROS MIMOS PARA ACOMPANHAR

Fazem ótima figura com qualquer um desses hot drinks, biscoitinhos, petit-fours, muffies, mini-pães, queijos suaves, manteiga e geleias caseiras.
PARA OUVIR E SABOREAR
Coffea Cantata BWV 211

MARCO MERGUIZZO é jornalista profissional especializado em gastronomia, vinhos, viagens e outras coisas boas da vida. Escreve neste coletivo toda sexta-feira. Me acompanhe também no Facebook e no Instagram, acessando @marcomerguizzo #blogaquelesaborquemeemociona #coletivoterceiramargem
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