A Tempestade e o Ímpeto da modernidade: um Brasil em chamas

LUIZ PIEROTTI – Há quase 5 séculos, na Alemanha, se criava a expressão Sturm und Drang (Tempestade e Ímpeto), termo utilizado para se referir ao movimento romântico que despontava na região.

Guiado por grandes nomes como Friedrich Schiller e Johann Wolfgang von Goethe, o movimento negava todo o racionalismo presente no iluminismo que reinava até então, o substituindo por uma visão mais subjetiva do mundo, impregnada de individualismo, emotividade e egocentrismo.

Como corrente artística, o romantismo figura como um dos movimentos mais importantes da história, seja pelo grande número de obras canônicas que viabilizou, seja pela nova visão de mundo que criava. Porém, e quando esse ímpeto tempestuoso volta à tona, mas desta vez coberto pelo manto da ignorância, ganância e violência?

Duas pinturas lado a lado. Na esquerda, Goethe, na direita Schiller. Escritores Alemães.
Os escritores alemães Goethe (esq.) e Schiller (dir.)

Dos cíclos, o pior

Ao longo de três décadas de vida, sempre ouvi que o mundo marchava em ciclos. Ciclos naturais, ciclos biológicos e ciclos sociais. Movimentos, vontades, buscas e desejos pareciam ressurgir sazonalmente.

Porém, confesso que apesar de sempre acreditar na comprovação da teoria pela observação despretensiosa dos cortes de roupa até então bregas que tomavam, com novo fôlego, as vitrines das lojas, ou pela ciranda conservadora-progressista nas rodas de conversa, nunca imaginei que me pegaria a comparar ações repulsivas da atualidade à termos e características literárias do século XVI.

Um joio e trigo misturado sem o menor pudor.

Fogo queimando a floresta amazônica
O fogo devora a floresta amazônica

A tempestade de fogo e o Ímpeto da mesquinhez.

Na última segunda-feira, às duas horas da tarde, o dia escureceu. Logo soubemos que a noite prematura era efeito de uma massa de ar frio que carregava consigo uma imensa e densa nuvem de cinzas provenientes das queimadas que ocorriam, há mais de dez dias, em florestas espalhadas por todo o território brasileiro, em sua maior parte integradas à Amazônia Legal.

Sturm und Drang!

Essas foram as primeiras palavras que passaram pela minha cabeça ao me deparar com colunas de fogo imensas que tragavam gigantes e centenárias árvores amazônicas. Talvez tenha sido a violência do termo, talvez a semelhança às sublimes fúrias naturais representadas nas telas de Abraham van Beijeren…

Quadro de Abaham van Beijeren. Um mar revolto destruindo diversos barcos, em um dia nublado.
River Landscape, obra de Abraham van Beijeren

Assim, fiz tristes conexões entre as ações desmedidas de intelectuais românticos e os atos bárbaros de produtores desmiolados.

Havia a negação da razão, havia o individualismo, havia o egocentrismo, mas sem nenhuma boa intenção. Sem arroubos artísticos, sem estéticas planejadas, sem engrandecimentos.

Vivemos dias de fogo, e precisamos gritar muito alto para sermos ouvidos, pois só assim penetraremos essa densa parede de fumaça e perturbaremos aqueles que negam não apenas a lógica e a razão, mas a própria manutenção da vida.

Um comentário em “A Tempestade e o Ímpeto da modernidade: um Brasil em chamas

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  1. Pierotti, parabéns. Post muito bom e corajoso, principalmente na sua ponte entre o Sturm und Drang alemão e os dias atuais. Pessoalmente penso justamente o contrário, que Schiller e Goethe são parte do nascimento do Iluminismo, do qual o romatismo parte. Mas gostaria de ler / ouvir mais seus argumentos. Concordo absolutamente que vivemos momentos de tempestade e ímpeto, as vezes terríveis, como acontecia no nascimento do Iluminismo. Liberdade, igualdade e fraternidade. Grande abraço.

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