Todos a Bordo – Diário de um Pandemônio (Maio/2020)

12 DE JUNHO DE 2020

São Valentino

FREDERICO MORIARTY

 O último beijo de Romeu e Julieta, por Francesco Hayez (1823)

Valentinus de Terni nasceu em 176 d.C. sob o Império de Cláudio II. O primeiro Cláudio governou no início da dinastia julioclaudiana, sobrinho de Tibério, gago, meio manco, feio pra danar, mas excelente administrador. Deu sequência aos preceitos de Otávio e organizou o Império Valentinus.

Era bispo católico nos primórdios pobres da Igreja. O Imperador encasquetou que soldados solteiros eram melhores guerreiros para as legiões. Proibiu os casamentos para os milicos de então. O bispo desafiou o César, casava pessoas e soldados sem distinção.

Antes da aceitação do Cristianismo pelo poder romano, foi um risco grande. Como não havia ainda a exigência do celibato e o santo homem era chegado num matrimônio, não perdeu tempo e casou-se também. Existem três histórias de milagres realizados pelo bispo casamenteiro.

A primeira é que ele se apaixonou por uma moça cega e ao tocá-la, esta passou a ver. Ficou grata e casou-se com um crush antigo. A segunda diz que ele abençoou um casal que era rejeitado por todos. Às escondidas fez o casamento. Quando voltaram ao povoado foram seguidos por dezenas de pombos em círculos. Na frente dos pais, ao comentar a novidade, os pombos formaram uma imagem parecida a um coração (daí o termo ‘pombinhos’ para casais).

A última diz que Serapia e Sabino (um centurião romano) foram impedidos de se casar por rejeição da família. O centurião buscou o bispo, pois a amada estava gravemente doente e ele queria uma união eterna, antes da morte dela. O bispo abençoou e batizou o casal, depois disso os casou e eles morreram logo após. Serapia da doença e Sabino, envenenado (sim, Shakespeare bebeu em ombros de gigantes).

O.bispo incomodava tanto que foi decapitado por Furius, a mando do Imperador romano e passou a ser, anos após o martírio, São Valentino. A data do martírio é 14 de fevereiro de 228. O mundo todo comemora a data como Dia dos Namorados, o Valentine’s Day dos saxônicos. Outros historiadores falam que o 14 de fevereiro não era a data da morte do santo. Criou-se a tradição para substituir a Lupercalia, uma festa em homenagem aos lobos e a loba que alimentou Rômulo e Remo.

No dia de São Valentino mandam-se cartas de amor e presentes. E neste país muito religioso, nos anos 50, a Associação Comercial de São Paulo criou a data dos namorados, porém botou em Junho (afinal já havia Carnaval em fevereiro para consumirmos e gastarmos). Aliás, foram esses santos homens do comércio paulista que inventaram o Dia das Mães e o puseram em Maio, afinal, que mesinho vazio, né?

Seguindo o papai, então o presidente da Associação Comercial Paulista nos anos 50 e criador das datas, Doria (o kid) liberou comércio e xópins antes do tempo, em plena escalada de casos da Covid. Os pombinhos, os sem-pombinhos, precisam comprar, senão a fome virá.

E viva Santo Antônio!!

Para encerrar a canção açucarada Endless Love, eleita pela revista Billboard a melhor música romântica da História.

Feliz dia das Namorados.

Feliz dia dos namorados, mascarados e ‘desnamorados

PEDRO CADINA / MARCO MERGUIZZO


11 DE JUNHO DE 2020

TM no dia dos enamorados pela vida

Amanhã, 12 de junho, dia (ou melhor, data comercial) do namorados, será mais uma oportunidade para reavaliarmos, em meio à fase mais aguda da pandemia e do afrouxamento do isolamento social, valores e significados para quem ama de verdade. Algumas reflexões e inflexões se tornaram imperativas, como os excessos de consumo e as extravagâncias que fazíamos antes da tragédia.

Deverão ficar no passado, portanto, adquirir coisas supérfluas e absolutamente desnecessárias, seja para afagar o ego do outro ou mesmo o nosso próprio. Ou comprar um presente caro, frequentar restaurantes luxuosos, para comemorar a data.

Hoje, cada vez mais, o menos é mais. Ou seja: a regra a ser aprendida e apreendida na dor da tragédia da Covid, é que devermos valorizar a essência, nos reconectarmos com as coisas simples e verdadeiras como a natureza e a nossa humanidade.

E vivermos o dia o dia de uma maneira intensa, agradecendo cada conquista e a possibilidade de permanecermos ainda vivos e refortalecidos para enfrentar os desafios e as vicissitudes que a vida nos impõem agora e sempre.

Nesse sentido, para não deixar passar em branco o dia de amanhã e curtir em casa o feriado de Corpus Christi, selecionamos alguns artigos de autores, aqui do bravo time do Terceira Margem, para quem é e está apaixonado pelo outro, por ler e pela própria vida.

Ótimas leituras e feliz dia dos enamorados pela vida.


10 DE JUNHO DE 2020

Indignação holográfica

MARCO MERGUIZZO

Mesmo nestes tempos de pandemia e de “quarentena flexível”, tem pipocado mundo afora uma série de manifestações sociais contra governos autoritários e pró-fascistas e, em especial, uma onda de protestos antirracistas, com quebra-quebras, saques e incêndios, gerada a partir do assassinato bárbaro do afro-americano George Floyd cometido, no final de maio, por um policial de Minneapolis.

Por conta da gravidade sanitária que afeta todo o planeta, me surpreendi com uma notícia veiculada num portal de notícias da Espanha sobre o primeiro protesto holográfico da história. Sim, você leu direito. Na pátria de Miguel Cervantes, a agitação popular agora começou a rolar não apenas nas ruas mas nas telas do computador, multiplicando os manifestantes e os ativistas em dezenas de milhares ou milhões.

Essa grande sacada dos espanhóis foi possível graças à velha técnica inventada nos anos 40 do século passado pelo Nobel de Física, o húngaro Isaac Asimov (1920-1992), mestre-maior da ficção científica, que consiste em criar imagens tridimensionais a partir da projeção da luz sobre figuras bidimensionais (não deixe de conferir os dois vídeos, abaixo). Ou seja, esse tipo de iniciativa pode se tornar cada vez mais comum, sobretudo nestes tempos de isolamento social compulsório.

Sem violar, portanto, a quarentena, o alvo das “manifestações virtuais” dos espanhóis foram as novas diretrizes das leis de Segurança do Cidadão ou “Ley Mordaza” (Lei da Mordaça), do Código Penal e da lei anti-terror do país. A divulgação do movimento, que “ocorreu” há cerca de duas semanas, ganhou as manchetes da mídia local e internacional e foi amplamente repercutido nas redes sociais, dentro e fora da Espanha.

Nos anos 70, o compositor Cartola protestando contra a violência da Polícia carioca diante da favela do Morro da Mangueira (Foto: Arquivo)

“Se você é uma pessoa, você não pode se expressar livremente e só pode fazer isso aqui se você se tornar um holograma”, anuncia a guapa espanhola no vídeo divulgado pelo movimento Hologramas para la Libertad. No site do movimento, os cidadãos foram convidados a participar desse primeiro protesto virtual, escrevendo uma mensagem de texto, deixando uma mensagem de voz gravada ou convertendo-se em um holograma através da gravação de um vídeo via webcam.

Sob a nova Lei de Segurança do Cidadão ou Ley Mordaza, como os defensores dos direitos humanos a rebatizaram ironicamente, protestos públicos, as liberdades de expressão e de imprensa e documentar os abusos policiais se tornaram crimes puníveis com multas pesadíssimas e, até, prisões por abuso de autoridade. Ah, se essa moda pega por aqui…

De todo modo, seja protestando nas ruas ou no papel de ativistas digitais do terceiro milênio, o negócio é jamais deixar de lado a nossa indignação diante da injustiça, da opressão e dos opressores. Como diz a velha máxima espanhola: “Se hay gobierno, soy contra!”

Viva, portanto, desde sempre, a liberdade de expressão e todas as conquistas sociais e civilizatórias!



09 DE JUNHO DE 2020

Sensações de terremoto

CARLOS ARAÚJO

Alta noite, você vai dormir abalado com mais um escândalo do governo federal, desta vez por conta da sonegação de dados da Covid-19 – medida que repete a mesma prática da ditadura militar na década de 1970 durante uma epidemia de meningite. Horas depois, ao acordar na manhã desta terça-feira (9), na fração de tempo entre abrir os olhos e se conectar com a realidade, você sente a casa tremer e é sacudido pela incrível sensação de que acontece um terremoto. Você logo cai em si e liga a origem do problema às obras do BRT que restringem os espaços da avenida em frente à casa. Será que as paredes vão resistir aos abalos? Da janela, você vê a máquina compactadora que vai e vem em ritmo acelerado e isso dura toda a manhã. Perto do local, outra máquina aguarda a hora de entrar em ação. Do lado oposto da avenida, a movimentação dos serviços também é intensa com a operação de outra máquina e um caminhão. Operários se deslocam no canteiro de obras. Os carros se movimentam em ritmo lento. E você pensa em isolamento social. Quando você é perseguido pela política autoritária de um governo do fim do mundo e a casa treme com o abalo provocado pela obra pública na avenida, o esforço do isolamento social se torna uma grande ilusão. A perturbação é como uma tortura, como um castigo. Ninguém aguenta esses terremotos. Ninguém merece.


A ressignificação do tempo nestes tempos de pandemia

MARCO MERGUIZZO

Trocar o dia pela noite e vice-versa. Segunda-feira com cara de domingo, domingo com cara de todo dia. Definitivamente, o isolamento social traz a sensação de perda da noção de tempo e o fenômeno tem até nome: distorção temporal. 

Uma mudança drástica, como a que estamos vivendo nestes tempos de pandemia do coronavírus, pode fazer com que percamos totalmente a noção de tempo. Quando deixamos de ter uma rotina diária, nossa linha do tempo interna é afetada, por isso, por vezes, pinta aquela dúvida sobre o dia da semana que estamos, a sensação de que as horas passam devagar demais, mexendo internamente com nossos relógios físico e, sobretudo, mental.

Essa sensação de se estar no “mundo da lua” e num território até então desconhecido, além de sobrecarregar nossa relação com o tempo, pode afetar o nosso emocional, nossos relacionamentos pessoais e familiares e a produtividade no trabalho remoto que realizamos. Isso é fato.

Para espantar e driblar esse “estresse reverso”, tenho organizado o meu dia a dia dosando compromissos profissionais, de pai, marido, filho, irmão e amigo, aliando-o âs tarefas domésticas (sim, homem que é homem também vai pra cozinha e lava a louça suja da pia), como se não houvesse pandemia.

A profissão do jornalista, cada vez mais precarizada e hoje um ofício de home-office (salvo raras exceções, as redações hoje empregam poucos profissionais, hoje a maioria é freelancer), também contribuiu para atravessar essa fronteira do trabalho presencial sem muitos traumas, já que havia virado uma rotina para mim.

Vejo amigos professores e outros profissionais (mesmo nós, veteranos da imprensa) metidos numa avalanche de calls, lives e se desdobrando em mil tarefas, para dar conta do recado. Sim, em casa, estamos trabalhando muito, muito mais.

Na prática, sabemos que a ressignificação do tempo e toda mudança não são coisas fáceis de serem digeridas. Além do quê, cada um tem o seu próprio tempo e ritmo, os quais devem ser respeitados.

O “Novo Mundo” que se apresenta e as batalhas cotidianas catalizadas pela Covid passaram a ser um grande e difícil teste para cada um de nós, bem como um desafio coletivo e permanente, para que possamos manter a nossa sanidade, sobrevivermos com dignidade, sem deixarmos de lado a nossa humanidade.

O Novo Mundo, que já está aí fora rolando, não pode nos derrotar.


08 DE JUNHO DE 2020

Uma cidade a caminho da UTI

JOSÉ CARLOS FINEIS

O movimento de pessoas nas ruas comerciais do centro de Sorocaba, no sábado (6/6) pela manhã, só poderia ser comparado a uma véspera de Natal, um dia depois do pagamento.

O afluxo de pessoas foi tão intenso que o site SorocananiceS (1,4 milhão de seguidores) ironizou se os sorocabanos não teriam confundido pandemia com black friday.

Naquele mesmo dia, foi publicado um estudo elaborado nos Estados Unidos segundo o qual o Brasil poderá chegar à marca dos cinco mil mortos por Covid-19 ao dia, em agosto.

Em Sorocaba, eram 61 mortos neste domingo (7), 30 a menos que em Jundiaí, cidade com menos habitantes mas que optou por liberar o comércio e serviços em meados de abril.

Nossa população se comporta como se não estivéssemos em ritmo ascendente de uma pandemia mortal. Talvez confiem mais em políticos negacionistas do que nos médicos e na Organização Mundial da Saúde (OMS).

Ao que tudo indica, os incrédulos terão de ver caixões empilhados, perder parentes e amigos, ou sentir na própria pele os efeitos da doença para acreditar que a Covid-19 não é uma gripezinha.

A explosão iminente de casos de Covid-19 poderia não ocorrer ou ser menor, se os governos se esforçassem por educar e ajudar as pessoas. Como não temos nada disso, muita gente morrerá.

Não chega a ser um consolo, mas os políticos que jogam com a saúde pública, liberando atividades não essenciais, desamparando e desorientando a população, responderão pela mortandade como o que verdadeiramente são .

Inconsequentes. Desumanos. Assassinos.


07 DE JUNHO DE 2020

O que aconselha a jovem Anne?

LUIZ PIEROTTI

Quanto a “sair”, ir até a varanda já está de bom tamanho, ok? Respeitemos o distanciamento social.

“Nesse momento não penso em toda miséria, mas na beleza que ainda resta. O conselho dela (minha mãe) face à melancolia é: “pensa em todo o sofrimento que há no mundo e dá graças por não estares a passar por ele”. O meu conselho é: “sai para a rua, vai ao campo, aprecia o sol e tudo o que a natureza tem para oferecer. Sai e tenta recapturar a felicidade que EXISTE dentro de TI próprio, pensa em toda a beleza que há em ti e em tudo o que te rodeia, e seja feliz. Se nos tornarmos parte do sofrimento, o que nos resta? Ficaríamos completamente perdidos. Pelo contrário, a beleza PERMANECE, mesmo na desgraça!”

O Diário de Anne Frank


06 DE JUNHO DE 2020

O Ministério da Verdade de 1984 existe

FREDERICO MORIARTY

Mil Novecentos e Oitenta e Quatro” foi escrito e publicado por George Orwell em 1948. Na distopia política não existem mais os países atuais. Somente uma ditadura planetária que controla todos os movimentos da vida social. Somos vigiados 24h por dia pelo Grande Irmão (o Big Brother). A língua quase desapareceu. Virou uma pátria lacônica a proferir meia dúzia de códigos: a Novilíngua. O regime tinha um lema: “Guerra é Paz. Liberdade é Escravidão. Ignorância é Força “.

Na trama, Smith é um funcionário do Ministério da Verdade. Como em toda a história, as palavras são paradoxos. O objetivo do Ministério é reescrever a história, de tal forma que a ditadura seja laureada. Smith é o reescritor dos jornais.

IngSoc, o país da Oceania. Novilíngua de Inglaterra Socialismo

Na maior crise econômica e sanitária de nossa história, o presidente demite dois ministros da Saúde. Coloca um general no cargo. Este, por sua vez, nomeia 10 militares como secretários executivos do alto escalão. Nenhum dos 11 é médico. Ninguém tem formação na área da saúde. Esta semana, o nosso Ministério da Verdade começou a sonegar informações da Covid. Retirou do sistema os dados completos da pandemia e, por último, decidiu rever e alterar os dados.

Ignorância é Força!


05 DE JUNHO DE 2020

Pandemia: os dados de Sorocaba

DATAFREDERICO

Frederico Moriarty vem acompanhando os dados da Covid-19 há exatas seis semanas. Naquele 25 de abril, a cidade estava com 99 infectados e 18 óbitos. Os internados eram 19 pessoas. Hoje, batemos em 1.233 casos (crescimento de 1.300%). São 60 os mortos (330% de acréscimo). Cinquenta e sete sorocabanos estão internados. Completamos ainda sete dias seguidos com novas mortes e aumento nas internações. E a Prefeitura decidiu o que esta semana? Reabrir quase tudo (negando o parecer técnico, médico e científico da equipe multidisciplinar da secretaria estadual de saúde).

Casos

óbitos

Na quarentena, a vida como ela é

MARCO MERGUIZZO

Feminino e masculino

Esculpindo Dalí na roupa suja


04 DE JUNHO DE 2020

Quais os limites de nossas tragédias e indiferenças?

MARCO MERGUIZZO

Assustador. Ultrapassamos os 33.000 mortos. Mais de 1.400 vítimas da Covid-19 só nas últimas 24h. E um silêncio ensurdecedor dos cidadãos de bem em meio a corpos empilhados, a maioria pertencente a pardos, negros e pobres. Se não bastasse tamanha tragédia humana, uma total indiferença em relação ao racismo bárbaro representado pelas mortes cruéis e inadmissíveis do menino João Pedro e do americano George Floyd, ocorridas nas últimas semanas. “Não estou conseguindo respirar”, repetiu ele 16 vezes, durante 8 minutos e 46 segundos, antes de morrer esmagado pelo joelho de um inumano fardado. O garoto, alvejado covardemente pelas costas, nem isso.

Nesta quinta (4/6), faz exatamente um ano que morreu Muhammad Ali, que nasceu Cassius Marcellus Clay Junior. Para mim e uma legião de amantes dos esportes, Ali foi o maior pugilista de todos os tempos. Uma lenda, um gigante e um mito de verdade – dentro e fora dos ringues – e não esses heróis fakes e impostores de fancaria da vez do esporte e da política. No auge da carreira, o incrível e exímio “bailarino da nobre arte”, como o boxe era chamado num passado politicamente não tão correto e já distante, se recusou a lutar na Guerra do Vietnã. Sobre esta sua decisão contra o establisment, ele disse à época:

“Não vou percorrer 10.000 km para ajudar a assassinar um país pobre simplesmente para dar continuidade à dominação dos brancos sobre os escravos negros”. Ao lado dos Panteras Negras, de Bobby Seale e Huey Newton, e de outro monumento antirracista, Malcolm X, seu “parça preto” de lutas, que foi assassinado pela covardia e intolerância higienista da estrutura branca de poder e o ódio visceral dos supremacistas da KKK, Ali era o primeiro a entrar nessa arena para lutar o bom combate, sem hesitar um só segundo.

Malcolm X e Muhammad Ali: racistas não eram páreo para eles (Arquivo)

Sabia que essa guerra civilizatória era necessária, crucial. Um conflito atemporal, permanente, com batalhas cotidianas, sem tréguas ou fim. Postava-se no corner oposto ao que hoje estão muitos atletas, sejam negros ou não, e como muitos de nós, ao se omitirem e fugirem desse ringue, por conta da força do egoísmo, da indiferença (“E daí?”) e da grana (“CPMF em vez do CPF, taokei?), seguindo a cartilha de indiferenças da maior autoridade do país, de total descaso com a vida humana.

Você, Clay (ops, me desculpe o ato falho e este longo parêntesis, meu velho Muhammad, lembro perfeitamente de sua fala sobre o seu nome de batismo. Como um soco demolidor, você cravou: “Cassius Clay era o nome de um escravo. Não foi escolhido por mim. Eu não o queria. Eu sou Muhammad Ali, um homem livre.”), o seu exemplo e inspiração representam o golpe certeiro, brutal e definitivo contra a infâmia do preconceito, do racismo vil e o elo perdido a ser resgatado de uma sociedade que se perdeu nos desvios de sua cegueira e desumanidade patológicos, e que, hoje, ironicamente, enfrenta um inimigo igualmente invisível, mortal e nocauteador.

Após 365 dias de sua morte, R.I.P. Muhammad Ali.

Vidas negras importam, sim.

A luta contra o preconceito e a indiferença agora é nossa.

#somosantirracistas #vidasnegrasimportam


03 DE JUNHO DE 2020

Verde que te quero comer-te

MARCO MERGUIZZO

Foto tirada na manhã desta 4ª após a madrugada chuvosa em S. Roque

Bem antes da pandemia da Covid-19, escrevi um artigo no meu blog, aqui no Coletivo Terceira Margem, sobre a possibilidade de se ter em casa, nos dias de hoje, uma produção própria de hortaliças, frutas e temperinhos sem o uso de agrotóxicos, como alternativa à mesa de uma alimentação mais saudável, saborosa, de procedência confiável e rica nutricionalmente.

Como os nossos avós, por sinal, faziam no passado ao cultivarem nos quintais das antigas residências uma hortinha, que em geral ficava ao lado de um galinheiro, a fim de garantir a despensa com produtos de qualidade sempre frescos, livres de pesticidas e contaminação e, de quebra, aliviar o bolso (para ler o artigo, clique aqui).

Moro numa casa térrea com um pequeno jardim em ‘L’. Na frente, impera no gramado um coqueiro de uns 4m, plantado ali há quase 30 anos, além de bromélias e orquídeas, que são o xodó da minha mulher, uma psicóloga que ama jardinagem. Já a outra parte, fica na lateral e é dividida em seis canteiros estreitinhos. Além de antúrios e lírios da paz, a apaixonada “analista de mentes e plantas” costuma cultivar em dois deles folhas variadas de chá, temperos e pimentas que usamos e abusamosna cozinha.

Ao longo das últimas doze semanas de quarentena, além de cuidar das plantinhas, ela se arriscou a cultivar – e deu super certo! – nossos primeiros tomatinhos-cereja e, acredite, um lindo pezinho de berinjelas, cujos dois únicos frutos crescem ao sabor da natureza, sem nenhuma pressa, sob o seu olhar solerte, feliz e orgulhoso.

Não é de hoje que a jardinagem e a agricultura familiar, sobretudo agora nestes tempos de pandemia e de isolamento social, podem ser não só uma boa terapia para a alma, mas também, uma saborosa e saudável alternativa para matar a fome e agradar o paladar.

Soube nesta semana que a Embrapa abriu cursos on-line e disponibilizou por 30 dias o download de livros sobre plantas brasileiras. Tem até um curso para criar abelhas em casa para produzir mel (veja logo abaixo). Já que o isolamento é fundamental e ultranecessário, que estes tempos em casa nos tragam novos aprendizados e a descoberta de novos caminhos, mudanças e recomeços. Abaixo, seguem os links dos cursos e livros.

Mãos na terra – e à obra. E ótimos frutos.

Para mais informações, eis aí os links:

Horta em Pequenos Espaços:
https://bit.ly/2X1mDre

Sistemas Agroflorestais para Pequenas Propriedades:
https://bit.ly/2WKjY6G

Compostagem:
https://bit.ly/2zczmzs

Agricultura de Baixo Carbono:
https://bit.ly/3bK7iRt

Produzindo em casa o próprio mel

 Desde esta 3ª (2/6), está no ar o primeiro e inédito curso on-line e gratuito sobre criação de abelhas produtoras de mel sem ferrão, mesmo para quem mora na cidade. Iniciativa da Embrapa Meio Ambiente e Associação Brasileira de Estudos das Abelhas (A.B.E.L.H.A.), o curso está disponível na plataforma da Embrapa e no canal da Embrapa Meio Ambiente no YouTube, com linguagem acessível, rico em imagens e demonstrações práticas.

Com informações sobre a biologia das abelhas sem ferrão e técnicas de manejo, é um curso a distância pra lá de completo sobre o assunto. Após assistir às quatro videoaulas, as pessoas estarão preparadas para iniciar sua própria criação e produzir mel produzidas por abelhas nativas do Brasil. Elas são sociais e dóceis – pois não têm ferrão – e podem ser criadas como hobby, mesmo em casa e centros urbanos, ou para fins comerciais, já que produzem méis especiais – alguns com grande valor de mercado. Anote o link da meliponicultura (mel de abelhas): https://bit.ly/36Wg9ig



O novo normal

FREDERICO MORIARTY

As pessoas reclamam que as crianças são indisciplinadas. Já viram os adultos nesse isolamento? Não conseguem fazer uma fila. Não conseguem ficar em isolamento. Não colocam a máscara por birra. E ainda que esteja pintado no chão o lugar para cada um ficar, não o respeitam. Tá igual na creche, tem de ter a tia pra organizar a fila.


02 DE JUNHO DE 2020

O ovo da serpente

FREDERICO MORIARTY

O grande ator e pensador inglês Stephen Fry esteve no Brasil em 2013. Produzia então o documentário sobre o homossexualismo e a homofobia no mundo, Out There. Ao final, ele entrevista um deputado da extrema-direita brasileira. Os diálogos são tensos, agressivos e desrespeitosos. Ao final, o político tupiniquim solta uma risada gutural, com um quê de psicopatia. Fry termina caminhando pelas ruas do Rio. Fala que foi a mais esquisita e sinistra entrevista que fez. Que é um típico homofóbico, o qual com suas mentiras faz surgir a violência na mente dos ignorantes. Ele se assusta muito pois considera o Brasil um país progressista. Mas que devemos estar atentos, pois a história nos ensina que o progresso pode ser abolido com facilidade. Por trás de toda morte existem vidas humanas que se perderam, não só estatísticas.

Esquecidos da história, passados 7 anos, levamos esse ser sombrio à presidência. Em meio a uma pandemia que ceifou mais de 30.000 brasileiros.

Assista, abaixo, o trecho da entrevista:


 1 DE JUNHO DE 2020

O trágico dia em que atingimos 30.000 mortos

MARCO MERGUIZZO

Embora ainda não oficialmente, neste 1º de junho de 2020, uma segunda-feira fria e sombria, mas que amanheceu ensolarada, bateremos o número catastrófico de 30.000 óbitos pela Covid-19. Um pesadelo e uma tragédia humanas que nos deprime e nos angustia, pois sem termos atingido sequer o pico da pandemia, para assim o Brasil poder reverter esse desastre sanitário, o afrouxamento do isolamento social e de medidas preventivas que vinham sendo praticadas durante a quarentena por estados e municípios, em oposição à narrativa ambígua do Governo Federal, serão agora trocadas por regras de flexibilização em que haverá a retomada de algumas atividades econômicas.

Uma estratégia no mínimo temerária para não dizer genocida que atende aos desejos do mercado e alinhada ao pensamento neoliberal da equipe econômica comandada por Paulo ‘Posto Ipiranga’ Guedes e à conhecida necropolítica presidencial. Sinistro e emblemático, o número de 30 mil mortos me remete a uma fala de Jair Messias Bolsonaro quando ele era ainda um deputado federal medíocre – e desde sempre boquirroto e com um discurso de ódio -, e não tinha pretensões presidenciais.

Este seu depoimento deprimente, dentre os muitos de sua polêmica trajetória política e que infelizmente acabaram sendo aceitos e “normalizados”, foi dado durante uma entrevista concedida ao programa Câmera Aberta, da rede Bandeirantes, em 1999. Neste mesmo programa, ele defendeu uma guerra civil no país, com o assassinato de pelo menos 30 mil pessoas. Além de incentivar a população a sonegar impostos: “Conselho meu e eu faço: sonego tudo que for possível”, disse.

Ainda coroou aquele show de horrores, ao qual hoje assistimos cotidianamente, afirmando com todas as letras que “o voto não vai mudar nada no Brasil. Só vai mudar infelizmente quando partirmos para uma guerra civil, fazendo um trabalho que o regime militar não fez. Matando uns 30 mil, começando com FHC, não vamos deixar ele pra fora, não”, ameaçou. “Meta pessoal” atingida em 2020, seus próximos objetivos e passos, tudo levar a crer, segundo sua agenda anunciada já àquela época, serão o golpe e a guerra civil. Acorda, Brasil.


31 DE MAIO DE 2020

Lamento informar, mas o planeta Terra não está nem aí para nossas aflições

JOSÉ CARLOS FINEIS

Durante milhares de anos e até séculos recentes, o Homo sapiens acreditou que não era um animal como os outros. Que a Terra – assim como os animais, as plantas, ou mesmo a beleza das montanhas e das estrelas – existia em função dele. E que o Sol girava em torno da Terra só para aquecê-lo e iluminar seus passos, assim como a noite e o luar existiam para acolhê-lo e inspirá-lo.

Hoje sabemos que por mais que nos achemos especiais, e apesar de muitos de nós haverem desenvolvido uma dimensão espiritual, o planeta Terra não está nem aí para aqueles que acreditam ser seus habitantes mais ilustres.

Em sua longa trajetória, como um elefante que marcha pela floresta sem se importar se carrega nas costas pássaros ou carrapatos, a Terra foi habitada por incontáveis espécies que desapareceram. Do ponto de vista biológico, ao menos – e por mais que nos esforcemos por crer o contrário –, somos apenas mais uma dentre milhões de espécies.

As pessoas aqui embaixo adoecem e morrem, se angustiam e se envolvem em disputas sangrentas, compram carros, trocam de emprego, trocam de família, se apegam a bens materiais ou buscam a iluminação – mas o céu segue impassível e indiferente, com sua beleza de azuis e cinzas e dourados e rosas e vermelhos que só muito raramente nos detemos para admirar.

Se a raça humana desaparecer amanhã, esse céu ainda estará aí, e mesmo que não restem olhos inteligentes para admirar sua beleza ele não deixará de misturar suas tintas conforme a estação e de ser o que é. O céu, a parreira, a roseira que meu pai plantou, as telhas mais velhas – de tudo o que é material ou inconsciente eu tenho uma certa inveja às vezes.

Hoje, particularmente, eu queria ser assim como esse céu azul: se não belo e radiante, ao menos imune aos sofrimentos e às angústias de nossa frágil civilização.


Não é só futebol

Torcidas dos 5 grandes do futebol paulista se unem pra defender a democracia e combater o fascismo. Viva as Antifas!


 

30 DE MAIO DE  2020

(Desg)Raça ariana

FREDERICO MORIARTY

Meio milhão de infectados. Quase 30 mil óbitos. E o presidente brindando aos nazistas e neonazis.

Quando a arte imita a vida.

Durante a quarentena, reveja o clássico Laranja Mecânica da cena acima. Para ler o texto sobre o filme, clique aqui.


 

Drummond (poema animado)

MARCO MERGUIZZO

Memória
CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Amar o perdido
deixa confundido
este coração.
Nada pode o olvido
contra o sem sentido
o apelo do não.
As coisas tangíveis
tornam-se insensíveis
à palma da mão.
Mas as coisas findas,
muito mais que lindas,
essas ficarão.

Drummond e Pedro Nava de máscara, no centro da capital Beagá (MG)

29 DE MAIO DE 2020

Sextando em ótima companhia

MARCO MERGUIZZO

Com uma letra primorosa e ainda atual, uma verdadeira obra-prima da MPB, esta canção de Chico Buarque foi gravada em 1976, período da ditadura militar, cujos tempos sombrios hoje nos assombram novamente: “O que não tem governo, nem nunca terá, o que não tem juízo…” Confira abaixo:

O Que Será (À Flor da Pele)

CHICO BUARQUE

O que será que me dá
Que me bole por dentro, será que me dá
Que brota à flor da pele, será que me dá
E que me sobe às faces e me faz corar
E que me salta aos olhos a me atraiçoar
E que me aperta o peito e me faz confessar
O que não tem mais jeito de dissimular
E que nem é direito ninguém recusar
E que me faz mendigo, me faz implorar
O que não tem medida, nem nunca terá
O que não tem remédio, nem nunca terá
O que não tem receita

O que será que será
Que dá dentro da gente e que não devia
Que desacata a gente, que é revelia
Que é feito uma aguardente que não sacia
Que é feito estar doente de uma folia
Que nem dez mandamentos vão conciliar
Nem todos os unguentos vão aliviar
Nem todos os quebrantos, toda alquimia
Que nem todos os santos, será que será
O que não tem descanso, nem nunca terá
O que não tem cansaço, nem nunca terá
O que não tem limite

O que será que me dá
Que me queima por dentro, será que será
Que me perturba o sono, será que me dá
Que todos os ardores me vêm atiçar
Que todos os tremores me vêm agitar
Que todos os suores me vêm encharcar
Que todos os meus nervos estão a rogar
Que todos os meus órgãos estão a clamar
E uma aflição medonha me faz implorar
O que não tem vergonha, nem nunca terá
O que não tem governo, nem nunca terá
O que não tem juízo


Angústia e imprecisão

FREDERICO MORIARTY

Desenho/Crédito: Angel Boligán

Pensei em estratégias para derrotar a Quarentena. Um plano perfeito, um mais ou menos, outro que parecia genial, um outro quase transcendental de tão bom. Botei na cabeça que aproveitaria as poucas horas livres em casa para rever quadros, espelhos e fantasias. Temperei a vida com alho, pimentão, açafrão e até coentro, que detesto.

Li que Newton fez não sei o quê na Peste, Shakespeare escreveu uma peça e o rato, coitado, foi massacrado injustamente no século XIV. A cada dia acordo disposto, a cada noite descanso pensativo, com as luas se seguindo numa velocidade inesperada, comecei a acordar em desespero e deixar de dormir sem destino.

Sessenta e nove dias se passaram. Não jejuei, não compus uma ópera, não escrevi um livro, não cumpri nenhuma das promessas que fiz silencioso. Pelo simples motivo de que era-me impossível cumpri-los. Shakespeare e Newton viveram num tempo em que a morte era uma certeza. Vivemos na era da morte absoluta. Newton estudou uma centena de livros. Hoje escrevem-se centenas de livros sobre Newton diariamente. Somos do tempo angustiado e ansioso. Shakespeare ainda era das horas do sino da Igreja.

A Pandemia nos inventou mais uma cobrança: a de que tínhamos de escrever uma Odisseia ou um Tratado de Física Contemporânea em 2 meses. Num momento em que somos bopmbardeados 25h horas por dia com notícias do vírus, da morte, da ciência, da negação da vida, do fim do trabalho, da recessão brutal.

Deixa pra lá!!!

Minha angústia é de outro gênero. Sinto um coração partido em falar com meus pais de 93 anos pelo telefone. Moram em São Paulo. São mais de 70 dias sem vê-los pessoalmente. Tem hora que dá vontade de sair gritando, pegar o carro e dar um abraço neles. Antes que seja o último. Fico doido em pensar que talvez quando tudo passe, eles tenham também passado.

Mas ao mesmo tempo, sei que no meu egoísmo em querer vê-los possa ser o responsável por transmitir a moléstia. Então, choro baixinho. E choro muito triste de todas as vezes em que pude dar o abraço e dizer o quanto os amava, mas preferi arremessar pedras e espinhos. O tempo é um ser que nos amaldiçoa com a lembrança.

Muitos aqui sentem falta do colo do avô, da avó, do beijo da irmã, do irmão, um pai, uma mãe e talvez a dor de estar distante de um filho. Não é uma dor comum. Se teu filho viaja a estudos e está meses sem poder vê-lo, aquilo corta teu peito, te dilacera, te rasga inexplicavelmente os sentidos. Mas pelo menos se tem a certeza de que um dia ele estará ali de volta, chorando e partilhando amor.

Agora com essa maldita Pandemia é distinto. Quando será o retorno? Não sabemos. Como será essa volta? Não sabemos. Como será o abraço? Será que haverá um abraço possível? A gente vê essas pessoas insensíveis com o outro, com o sofrimento, com a distância obrigatória, passeando pelas ruas como se nada houvesse acontecido, apenas escarrando sua falta de humanidade. Dói.

Só espero que seja breve. Que eu possa olhar nos olhos antigos de meu pai e minha mãe, segurar naquelas mãos já enfraquecidas pela idade, abraçá-los com a maior força possível (não tanto pra não esmagar os ossos fracos), chorar como criança e gritar: essa é minha sinfonia para o mundo.

(No séc XIV Boccaccio nos deu um antídoto contra uma Pandemia. Leia nosso texto aqui)

 


Sempre é tempo de viajar

MARCO MERGUIZZO

Foto/Crédito: Luiz Bhering


Viajar não é só conhecer novos lugares, trocar a roupa da mala. Uma grande viagem – e necessária – é mergulhar fundo em nosso interior e mudar a roupa da alma. A quarentena continua. #fiqueemcasa #usemáscara


28 DE MAIO DE 2020

Futebol é resistência

FREDERICO MORIARTY

Primeiro foram Fluminense e Palmeiras. Cortaram os direitos de imagem dos jogadores de elite (alguns perto de 1 milhão mensais). Mantiveram os empregos dos funcionários do clube e não cortaram gastos das categorias de base e do futebol feminino. Veio a viagem do terror. Dirigentes de Flamengo e Vasco foram a Brasília demonstrar apoio ao presidente genocida. Como sempre, o populista vestiu a camisa dos clubes, posou pra fotos e berrou espirrando saliva:

– Queremos futebol!!

A reação contra a barbárie foi rápida. Andrés Sanches, presidente do Corinthians, narra uma carta-protesto. Em suma, bradou com veemência:

– No Estado de São Paulo, a gente preserva a vida. Não é hora de futebol!!

Assinado embaixo por Santos, São Paulo e Palmeiras. Se depender dos 4 grandes paulistas (gigantes agora) não vai ter jogo.

Os ventos gelados do Sul trouxeram uma nova esperança. Depois do protesto das Gaviões contra um desfile fascista, torcedores do Inter e do Grêmio se reuniram inesperadamente e foram pra rua demonstrar força e capacidade de dispersão. Destruíram mais uma passeata fascista de apoio ao presidente. E tem gente que ainda acha o futebol alienante…

Quer ler mais sobre futebol? Não deixe de conferir o nosso artigo sobre Pelé, clicando aqui.


 

Fruto da estação

MARCO MERGUIZZO

Às portas do inverno e com os termômetros flertando entre o 1º C e 3ºC positivos, nesta madrugada aqui, no Principado de São Roque, já deu pra experimentar um pouco aquela sensação gelada de bater o queixo, típica da estação mais fria do calendário. Sinônimo à mesa e com gostinho desse período do ano, o pinhão faz a alegria dos fãs dessa semente comestível, originária de regiões montanhosas do país, como Campos do Jordão, em São Paulo, e de cidades localizadas nas serras da Mantiqueira, fronteira com Minas, gaúcha e catarinense.

No blog Aquele Sabor Que Me Emociona, você confere logo mais um post exclusivo sobre esta tentação gastronômica irresistível. Enquanto isso, de tira-gosto, aqueça o paladar e a curiosidade, lendo os versos do poeta gaúcho Mario Quintana (1906-1994) e curtindo a modinha “Pinha no Pinheiro”, do álbum Marcando Estrada (1996), na voz Sérgio Reis.

Canção do Inverno

MARIO QUINTANA

“Pinhão quentinho!
Quentinho o pinhão!”
E tu bem juntinho
Do meu coração…”


27 DE MAIO DE 2020

Fernando Pessoa na web e de graça

MARCO MERGUIZZO

Fernando Pessoa e os seus muitos heterônimos (Fotos: Arquivo)

Desde que li pela primeira vez FP, ainda molecote, me deslumbrei com seus poemas monumentais. Mais precisamente com o Livro do Desassossego. Resultado? Desde então, virei fã de carteirinha do maior dos poetas portugueses. Curiosamente, o craque da “última flor do Lácio” teve inúmeros nomes fictícios, como Alberto Caeiro, Álvaro de Campos e Ricardo Reis, dentre os mais conhecidos dos seus heterônimos. Pessoa foi uma personalidade absolutamente fascinante e extremamente rica, que enriqueceu como poucos a história da Literatura Portuguesa.

Nestes tempos de isolamento, tenho tido a felicidade de reler o gajo e vários autores que eu tenho uma profunda admiração. Como leitor das antigas, ainda gosto muito dos livros em papel. Muito embora o tablet venha me seduzindo cada vez mais pela praticidade e a facilidade de carregar uma biblioteca literalmente numa das mãos, podendo ser acessada num simples toque.

Vantagens que a rede mundial de computadores e a tecnologia hoje proporcionam. Embora não seja uma super novidade nestes tempos digitais, li num site de cultura que grande parte do legado do maior poeta de Portugal agora pode ser baixado na faixa. Todo fã do escritor como eu e o bolso agradecem. Portanto, vale essa dica, oh pá! Anote o link (https://bit.ly/3egmmrE) para baixar as preciosas obras de Fernando Pessoa. Vamos aproveitar esse tempo em casa para lê-lo ou relê-lo e, parafraseando o próprio poeta, a navegar, porque é preciso, por livros nunca dantes navegados.


O barquinho

Quarteto do Rio: eita Brasil bom de bossa


26 DE MAIO DE 2020

No friozão, o terror de O Iluminado

FREDERICO MORIARTY

Stephen King estava com 28 anos. Desempregado, vivia de vender pequenas histórias e dar aulas de gramática. Sua esposa, também escritora, trabalhava no Dunkin Donuts. O salário anual do casal não passava dos US$ 10.000. Moravam num trailer e tinham 2 filhos (o menino com 3 e a menina com 1,5 ano). King acabara de escrever seu terceiro romance. Achou um lixo e jogou na lixeira. A esposa pegou o manuscrito, sugeriu algumas ideias e mandaram pra uma editora (a 72° que ele tentava desde o início da carreira, sempre sem sucesso).

Naquele dia, o casal pedira dinheiro emprestado pra comprar remédio para o filho. Dois meses depois, King recebe uma ligação da editora. Haviam comprado os direitos autorais da obra. Stephen King esperou a oferta e o editor soltou a bomba: US$ 250 mil pelos direitos de Carrie, a Estranha. No ano seguinte, em 1974, Hollywood pagou o dobro para levar a obra ao cinema.

Quatro anos depois, sossegado e famoso, mas sem perder o costume de beber muito, ele escreve um romance sobre um professor desempregado e alcoólatra, às voltas com um filho pequeno. Tempos depois, Stephen percebeu que O Iluminado era autobiográfico. Stanley Kubrick dirige o filme de terror em 1980. Com o estupendo Jack Nicholson no papel principal. Os dois gênios têm coincidentemente a mesma inicial: SK.

O blog do Frederico Moriarty recomenda que assistam ao filme à meia-noite, com muita escuridão e silêncio (só o barulhinho da pipoca e do cobertor enroscando). O medo será ampliado. E também o filme Hair (leia nosso post aqui) e Blade Runner (outro post aqui). Afinal, o cinema é uma boa ideia nesse período de quarentena.


 

Pão com ovo na taça

MARCO MERGUIZZO

O clássico e irresistível Whiskey Sour: xô, friozão! (Foto: Arquivo)

A semana começou congelante no turístico ‘Principado’ de São Roque, como costumo chamar o conhecido município vizinho à ‘Grande Sorocaba’, onde moro há quase três décadas. Habituado ao friozão que faz por aqui, costumamos cultivar nestas latitudes o hábito de bebericar vinhos, sorver aos baldes cafés e chás e dar uma bicadinha em todo tipo de bebidinha quente que aquece o paladar e o corpo.

Para quem continua sabiamente em casa, em quarentena, e costuma arriscar-se a preparar drinques, sugiro fazer um dos mais conhecidos clássicos do bar: o despretensioso e facílimo de preparar whiskey sour. Simples e confiável na hora do aperto, não por acaso essa tradicional preparação é apelidada de “pão com ovo da coquetelaria americana”.

Segundo reza a lenda, o escritor Edgar Allan Poe, autor de clássicos da literatura, como os macabros O Corvo e O Gato Preto, era fã da beberagem. O personagem de Tom Ewell em “O Pecado Mora ao Lado” também. É ele quem diz: “Sou perfeitamente capaz de fazer meu próprio café da manhã. Hoje mesmo comi um sanduíche de manteiga de amendoim com dois whiskey sours”. Para conferir a receita e outras histórias desta antologia do balcão, clique agora aqui. Quer ler mais sobre drinques, só que à base de café? Então, clique aqui.


25 DE MAIO DE 2020

Sorocaba preocupa

FREDERICO MORIARTY

Segui os passos do professor Wolney e elaborei 2 gráficos com dados de Sorocaba. No dia 25 de abril, Sorocaba chegava ao seu 99° caso de Covid, com 18 óbitos. Levamos 14 dias para chegar aos 200 casos. Para os 300 foram 6. Passamos de 400 em 5 dias. Os 500 casos vieram em 4. O número 600 veio com 3 dias. Estamos com 658 casos confirmados. Um crescimento de 549% em 1 mês. As mortes mais que dobraram: de 18 para 40. A cidade de São Paulo chegou ao 100° caso em 15/3. Passou dos 658 em 29/3, mas tem uma população 18 vezes maior que a nossa. Podemos estar apenas no início da contaminação na cidade. Saberemos em 21 dias. Cuidem-se!


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🎼 🎵 É pau, é pedra… 🎶🎵

 

🎵 São as águas de Maio fervendo o pinhão

É promessa de vinho que vira quentão…

🎶🎵🎶🎵


Águas de Março (Tom e Elis Regina)

Águas de Março (Maria Rita)


Contra fatos não há argumentos

FREDERICO MORIARTY

O físico, professor e pedagogo Wolney Melo vem publicando análises de dados da covid-19 em sua página do feice. Hoje foi a vez de Blumenau, a cidade que reabriu o shopping local no mês passado… Diríamos: “Que curva hein… exponencial.”


24 DE MAIO DE 2020

Domingos de antigamente

MARCO MERGUIZZO

Esta belo e singelo desenho animado integra o DVD “Cantigas de Roda” (2015), da Palavra Cantada, da dupla de animadores e contadores de histórias infantis, Sandra Peres e Paulo Tatit. É uma adaptação da trovinha “Hoje é Domingo”, uma obra de domínio público ultraconhecida e muito popular na infância de muitos marmanjos acima dos 40. Reouça, curta e volte aos bons tempos de infância. Ótimo domingo pra quem tem criança em casa e pro menino e menina que ainda vive em você.

Animação/Crédito: Palavra Cantada

Que tudo passe

Paulo Leminski

Tudo passará

O cantor Nelson Ned cantando em espanhol, inglês e francês um dos maiores clássicos do seu repertório. Se a qualidade remasterizada do vídeo não é lá grande coisa, a interpretação e a apresentação do “Pequeno Gigante da MPB” são apoteóticas. Vale muito assistir. (MM)

23 DE MAIO DE 2020

Aguente firme

Everybody Hurts (Pearl Jam)

When your day is long and the night

The night is yours alone

if you’re sure you’ve had enough of this life

Well hang on

Don’t let yourself go, ‘cause everybody cries

and everybody hurts, sometimes …

Sometimes everything is wrong,

Now it’s time to sing along

When your day is night alone (hold on, hold on)

If you feel like letting go (hold on)

when you think you’ve had too much of this life

Well hang on

‘Cause everybody hurts

Take comfort in your friends

Everybody hurts

Don’t throw your hands, oh no

Don’t throw your hands

If you feel like you’re alone

no, no, no, you’re not alone

If you’re on your own in this life

The days and nights are long

When you think you’ve had too much

of this life, to hang on

Well everybody hurts,

sometimes, everybody cries,

And everybody hurts …

sometimes

But everybody hurts sometimes

So hold on, hold on, hold on, hold on, hold on,

hold on, hold on, hold on, hold on, hold on

Everybody hurts

You’re not alone


Ipsis litteris, minha casa, meu mundo


Vamos nos divertir

FREDERICO MORIARTY

A indústria cinematográfica produziu mais de 500.000 filmes nos últimos 130 anos. O Kindle disponibiliza 1.000.000 de livros para ler sem sair de casa. A música pop, rock, jazz, blues, MPB, sertaneja, sofrência tem 10.000.000 de áudios nos Deezer e Spotify da vida. Há um sem número de CDs e concertos de música clássica acessíveis. Todos, simplesmente todos os grandes e médios museus do mundo, têm acervos online e gratuitos.

Que tal rever o clássico Blade Runner? Link sobre o filme aqui.

Há uma imensidão de revistas eletrônicas pra ler de qualquer canto, a qualquer hora, em qualquer meio. Existe televisão aberta e paga com 24h de programação. Temos vídeogames. Canais de esportes passam jogos antigos o dia todo, a maioria deles nunca vimos (assisti a Copa de 74 todinha). Companhias teatrais têm disponibilizado peças inteiras na internet. Dá pra conversar virtualmente com o mundo todo.

A maioria das pessoas que conhecemos jamais cruzamos na rua ou no máximo vemos uma vez por ano, não morremos de vontade de abraçá-las. Antes da pandemia, todos nós passávamos dia sim e o outro também reclamando dos outros. Mas as pessoas insistem em dizer que estão entediadas. Solitárias e o que é pior, escrevendo horas e horas sobre esse ridículo governo e o inominável presidente (mesmo eu caio nessa asneira). Pela sanidade de todos nós, vamos falar sobre o que realmente vale a pena?

Cena de “O Iluminado”, 40 anos da estreia, hoje: vamos rever
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Navegar, remar, lutar


22 DE MAIO DE 2020

Fascistas

FREDERICO MORIARTY

1.188 óbitos num dia. 😰😰
Mais de 20 mil mortes. 🏴🏴
Mais de 320 mil infectados. 😢😢
Quase 5 milhões de brasileiros com parentes próximos acometidos pela Covid. 💔💔
E a deputada Bia Kicis (PSL-DF) tripudia da dor. Parabéns a ela e a quem a elegeu.


 

Nossas Pietás

MARCO MERGUIZZO

Cartum: Jota Camelo

Pesadelo dentro do pesadelo. Se já não bastasse o triste registro alcançado nesta quinta (21) de 20.083 óbitos pela Covid-19, a morte terrível do adolescente negro João Pedro Mattos Pinto, de 14 anos, no começo da semana, mais precisamente na terça (19), durante a ação truculenta da PF numa favela do Rio de Janeiro, me abalou profundamente e aumentou ainda mais minha sensação de impotência e indignação diante da tétrica realidade brasileira, cuja escalada de caos social, ruína e falência institucionais se agigantam diante de nós a cada momento. Tanto o desenho do cartunista Jota Camelo (acima) quanto o de Renato Aroeira (abaixo) expressam toda a dramaticidade e crueldade de mais este ato de violência policial. E, assim como a dor imensurável dos pais do garoto João Pedro, meu coração sangra. Quantas vidas mais serão interrompidas? Até quando e quanto ainda mais suportaremos?

Cartum: Renato Aroeira

Auschnaro e Bolsowitz

Cartum: Renato Aroeira

Durante e depois da pandemia


Meme: Agostinho Sincero

21 DE MAIO 2020

Capetão Cloroquina, o matador

MARCO MERGUIZZO

Bem que disseram, durante as últimas eleições, a de 2018, que a política do capitão era “matadora”. Taí. Promessa cumprida: 19.000 mortos, recorde seguido de vítimas nas últimas 48h, curva ascendente de óbitos e o Brasil já se tornando, desde ontem (20/5), o número 1 no ranking de casos novos, e o terceiro no de mortes, atrás apenas do Tio Sam, que tem o dobro da nossa população, e da Rússia, com uma população de pouco mais de 140 milhões de habitantes.

Não por acaso o atual ocupante do Planalto ganhou a alcunha de Capitão Cloroquina, graças ao medicamento que ele elegeu como panaceia para a Covid-19, porém, amplamente desautorizada pela OMS e autoridades médicas. Pelos desatinos, truculência, vilania e breguice presidenciais exibidos dia sim e no outro também, lembrei do personagem criado nos anos 80 por Chico Anysio: o caricato e folclórico Bento Carneiro, o vampiro brasileiro – uma crítica bem-humorada do maior e mais profícuo comediante do país, falecido em 2012, às bufonices dos heróis brazucas e à nossa histórica e risível vira-latice.

Super-herói às avessas ou anti-herói, o “mito”, como seus fanáticos apoiadores o chamam, superou todas – e as piores – expectativas. “Minha vingança ‘sará’ ‘malígrina'”, dizia o vampirão no melhor estilo Weintraub ao perpetrar suas maldades inofensivas. Perto dos malfeitos e vampirices do ‘Capita’ Cloroquina, Bento Carneiro é fichinha, café pequeno. Pensando bem, em vez de Mito, seria melhor chamá-lo de “Minto” (de mitômano), o “capetão” brasileiro matador. Tá soda, Chico.

Xô Capitão! Xô 2020! Vem 2021.

(Fotos: Arquivo. Meme: autor desconhecido do Facebook)

Política Tubaína (haikai)

(Crédito: Eduardo Foresti/FB)

20 DE MAIO DE 2020

Que não sejam em vão

MARCO MERGUIZZO

FECHADO POR LUTO. Brasil, 19/05/2020. 18.000 vítimas do coronavírus. 1.179 brasileiros mortos em 24h. Tragédia humana e uma profunda dor. Não verás país como este.


Itubaína

FREDERICO MORIARTY

O irmão do Norte, sócio da empresa, tentou. O Recruta Zero adotou. Um remédio para malária, septuagenário, ineficaz e com claros e danosos efeitos colaterais, virou bandeira e salvação. E o ex-soldado botou o exército pra fabricar, sem licitação, zilhões da pílula de farinha vencida. Ninguém queria. Demitiu os sinistros da saúde. Botou os militares no ministério. Agora vai. A farra da cloroquina. O Brasil é para amadores.

 


Tubaína! Democracia! Vivas!!

MARCO MERGUIZZO

Mais uma piadinha de mau gosto, outro trocadilho infeliz. Apesar da infâmia proferida novamente, nesta terça (19), pelo presidente da República miliciano – “Quem é de direita toma cloroquina, quem é de esquerda, Tubaína” -, o festejado refrigerante é nosso e nenhum fascista tasca. Já escrevi sobre esta gostosa invenção caipira no meu blog Aquele Sabor Que Me Emociona, aqui no Terceira Margem. Se quiser ler e descobrir a origem e outras dicas sobre o mais típico e cultuado refrigerante de interior, clique aqui. Mas vale lembrar: só entra no clube de apreciadores de uma legítima tubaína – que é 100% nacional – quem ama a democracia de verdade, taokey?

#vivaatubaina #vivaademocracia #forabolsonaro #emdefesadademocracia


19 DE MAIO DE 2020

O Novo Amanhã

FREDERICO MORIARTY

Quando acabar tudo isso, não sairemos às ruas abraçar calorosamente as pessoas. Pois o hoje nos mostrou que um bom número delas não era merecedora do nosso afeto. Não faremos festa de confraternização, pois muitos deixaram o outro de lado e comemoraram em meio aos cadáveres. Alguns irão (finalmente) trabalhar de olhos abertos porque ficou claro que somos apenas um número, um peso morto, uma estatística. Quem sabe o Novo Amanhã sirva como um veneno contra a hipocrisia. Mesmo que montado sobre a pilha de mortos. Somos uma sociedade egoísta, uma miríade de ilhas postadas num distanciamento social mesmo antes dele existir. Apenas uma multidão de corpos esperando nossa cova chegar.

Fonte: FolhaPress

Paradoxo alimentar

MARCO MERGUIZZO

” – É com grande pesar que todo dia eu me peso.

 


Quero só um pão na chapa

Marcio Alemão é escritor e roteirista dos filmes “Viva Voz” e “Caixa Dois”

Navalha na carne


18 DE MAIO DE 2020

Roleta do isolamento (vídeo)

Boa quarentena e bons goles.

Vírus do Brasil (haikai)

MARCO MERGUIZZO

.

Em honra do grande Millôr Fernandes. Saudades da sua inteligência mordaz e haikais demolidores, além de ter sido um frasista insuperável. São dele: “Livre pensar é só pensar” e “Divagar e sempre”, entre outras incontáveis sacadas e criações. Valeu, Millôr.

.

Corona. Covid.

Covarde. Corrompe.

Conspurca.

Conluia. Constrange.

Quo vadis?

Mortem et litteræ,

insidiatoris in patria

Cartum (crédito): Gilmar (@cartunistadascavernas)

Números sombrios

FREDERICO MORIARTY

Montei um quadro para ilustrar melhor o que nos aguarda se insistirmos em acreditar no falso Messias e a desafiar a Ciência


17 DE MAIO DE 2020

Oh, happy day (na ‘DesQuarentena’)


Inflexões da Pandemia (Poemeto)

 

Texto: Luiz Carlos Heringer (*) / Desenho: Angel Boligán

Eu
E alguns outros
Já velhos, adultos
Feito bebês
Trocamos o dia pela noite
E adormecemos às 3 da matina
Acordando ao meio-dia
Não é normal!
Bacurau.

Agora atentos
Ao que até então era despercebido
As belezas do céu estrelado
A lua esplendorosa
Os belos e suaves cantos das aves
A natureza é um poema!
Seriema.

w.w.w
Um mundo novo
Que até ontem nem se sabia
Um universo louco
De tão grande e misterioso
Que viajamos
Mas nos perdemos por lá
Carcará!

Ler o jornal
É tenebroso
Ler o obituário
É pavoroso
E fugimos
Rimos com os memes
Nos iludimos com as fake news
Gritamos pelas janelas
Batemos panelas
Queremos luz!
Urubus!!

Live, virou vida
Ver amigos ou celebridades
Ver pessoas, parentes
Câmeras ao vivo
De cidades distantes
De aves nos ninhos
Em comedouros
Ver lugares onde nunca fomos
E que talvez nunca venhamos a ir
Vemos agora tudo isso
Como se novo
Com outro olhar
Outro valor
Beija-flor

Aglomerações
Estão proibidas
Ir ao mercado
Somente em filas
E com lugares demarcados
E ainda mascarados!
Até nos estabelecimentos
Bancários!!!
E as avenidas estão vazias
As ruas estão quietas
E os passeios desérticos
Pombos domésticos!

Aprendo no YouTube
Uma receita esperta
Fonte de vitamina C
Coloque pra congelar
O rico limão
Depois, no ralador
Ralar com casca e tudo
Fica delicioso
Se misturado
Ao suco de uva:
Juruva!

(*) Luis Carlos Heringer é fotógrafo profissional e poeta.


16 DE MAIO DE 2020

Música, maestro

Todos em casa, em isolamento, músicos da Orchestra for the Earth gravaram esta versão especial de “Ich bin der Welt abhanden gekommen”, do compositor austríaco Gustav Mahler. Lindo de se ver e ouvir. #ficaemcasa

Sessão Pipoca

 

Stay home and on the force side


Um pai. Um filho. A peste.

A carta endereçada ao escritor colombiano Gabriel García Márquez, que faleceu em 2014, escrita nestes dias de pandemia, por seu filho, o produtor e diretor de cinema Rodrigo García. Texto tocante, profundo, publicado originalmente no NY Times, em 6/5/2020. Caso prefira lê-lo no original, em inglês, clique aqui e vá para a página do jornal. (Marco Merguizzo)

Carta para meu pai, Gabriel García Márquez

Gabo,
17 de abril foi o sexto aniversário de sua morte, e o mundo continuou em grande parte como sempre, com seres humanos se comportando com crueldade impressionante e criativa, generosidade e sacrifício sublimes, e tudo mais.
Uma coisa é nova: uma pandemia. Originou-se, tanto quanto sabemos, em um mercado de alimentos em que um vírus saltou de um animal para um humano. Um pequeno passo para um vírus, mas um grande salto para esse tipo. É uma criatura que evoluiu ao longo de um tempo incalculável através da seleção natural para o monstrinho voraz que é agora. 
Mas é tão injusto me referir a ele em tais termos, e lamento se minhas palavras o ofenderam. Na verdade, não carrega nenhuma má vontade em particular em relação a nós. Leva e leva, porque pode. Certamente, podemos nos relacionar. Não é nada pessoal.
Não se passa um dia em que eu não me deparei com uma referência ao seu romance “Amor no tempo da cólera”, ou um riff em seu título ou à pandemia de insônia em “Cem anos de solidão”. É impossível não especular sobre o que você teria feito de tudo isso. Você sempre foi fascinado por epidemias, reais ou da imaginação literária, bem como por coisas e pessoas que retornam.
Você ainda não nasceu quando a pandemia de gripe espanhola flagelou o planeta, mas você cresceu em uma casa onde reinavam as histórias e onde uma praga, como fantasmas e arrependimentos, devia ter sido um bom material literário. Você disse que as pessoas falariam de eventos passados ​​como coisas que aconteceram nos dias do cometa, provavelmente referindo-se à passagem do cometa de Halley no início do século XX. 
Lembro-me de como você estava ansioso para vê-lo com seus próprios olhos quando ele voltou no final do milênio. Ele te hipnotizou, um relógio misterioso que tocava a hora silenciosa uma vez a cada 76 anos, um ciclo que aproximava o tempo alocado aos seres humanos. Uma coincidência? Provavelmente apenas outro arenque vermelho. Você era ateu, mas também ponderou que era inconcebível que não houvesse plano mestre, lembra? Nenhum contador da história.
Uma pandemia está de volta. Apesar dos grandes avanços da ciência e da tão célebre ingenuidade de nossa espécie, nossa melhor defesa até agora é simplesmente ficar em ambientes fechados, se esconder em cavernas do predador. É um momento humilhante para aqueles com pelo menos um pouco de inclinação para a humildade. Para outros, é outra coisa incômoda para esmagar.
Dois países queridos, Espanha e Itália, estão entre os mais atingidos. Alguns de seus amigos mais antigos estão fazendo o melhor possível nos mesmos apartamentos em Barcelona, ​​Madri e Milão, onde você e Mercedes visitaram inúmeras vezes ao longo de décadas. Eu ouvi várias pessoas daquela geração dizerem que estão determinadas a persistir, mesmo que não por outra razão, para evitar serem mortas por uma gripe após décadas de câncer, tirano, emprego, responsabilidade e casamento sobreviventes.
Não é apenas a morte que nos assusta, mas as circunstâncias. Uma saída final sem despedidas, com a presença de estranhos vestidos como extraterrestres, máquinas apitando sem coração, cercadas por outras pessoas em situações semelhantes, mas longe do nosso povo. Seu próprio pior medo, solidão.
Você costumava falar do “Um Diário do Ano da Peste” de Daniel Defoe como uma das suas maiores influências, mas até ontem eu tinha esquecido que até o seu favorito, Oedipus Rex, depende dos esforços de um rei para acabar com uma praga. Sempre foi a trágica ironia do destino do rei que esteve na vanguarda da minha lembrança, mas foi a praga que desencadeou as forças que precipitaram o resultado.
Você disse uma vez que o que nos assombra nas epidemias é que elas nos lembram o destino pessoal. Apesar das precauções, cuidados médicos, idade ou riqueza, qualquer um pode desenhar o número azarado. Destino e morte, assuntos favoritos de muitos escritores.
Eu acho que se você estivesse aqui agora, como sempre, seria encantado pelo homem. O termo “homem” não é mais muito usado dessa maneira, mas vou abrir uma exceção não como um aceno ao patriarcado, que você detestou, mas porque ecoará nos ouvidos do jovem e aspirante a escritor que você uma vez foram, com mais sensibilidade e idéias em sua cabeça do que você sabia o que fazer, e com um forte senso de que os destinos são escritos, mesmo para uma criatura à imagem de Deus e amaldiçoada com livre arbítrio. 
Você teria pena da nossa fragilidade; você ficaria maravilhado com a nossa interconexão, ficaria triste com o sofrimento, enfurecido pela insensibilidade de alguns dos líderes e comovido pelo heroísmo das pessoas nas linhas de frente. E você ficaria ansioso para ouvir como os amantes enfrentavam todos os obstáculos, incluindo o risco de morte, para ficarem juntos. Acima de tudo.
Algumas semanas atrás, durante nossos primeiros dias isolados em casa, minha cabeça estava se esforçando para explicar para mim mesma o que tudo isso poderia significar, ou pelo menos o que poderia resultar disso. Eu falhei. O nevoeiro estava muito pesado. Agora que as coisas se tornaram mais cotidianas, como as coisas acabam mesmo nas guerras mais assustadoras, ainda não consigo enquadrar tudo de maneira satisfatória.
Rodrigo e o pai, o escritor Gabriel García Márques (Arquivo pessoal)
Muitos têm certeza de que a vida nunca mais será a mesma. É provável que alguns de nós façam grandes mudanças, outros façam algumas mudanças, mas suspeito que a maioria retornará ao baile. Não será bom argumentar que a pandemia é a prova de que a vida desaparece das formas mais inesperadas e, portanto, devemos viver grandes e viver agora? Um de seus próprios netos expressou essa opinião.
Restrições ao movimento estão começando a relaxar em alguns lugares, e pouco a pouco o mundo tentará se aventurar em direção à normalidade. Mesmo sonhar acordado com a liberdade iminente faz muitos começarem a esquecer as promessas que fizeram recentemente aos deuses. 
O esforço para processar o impacto da pandemia em nossos seres mais profundos e em toda a tribo está diminuindo. Mesmo muitos de nós que desejam entender o que aconteceu serão tentados a interpretá-lo ao nosso gosto. Já fazer compras ameaça fazer um grande retorno como nosso narcótico favorito.
Eu ainda estou no nevoeiro. Parece que agora vou ter que esperar pelos mestres, presentes e futuros, para metabolizar a experiência compartilhada. Aguardo ansiosamente por esse dia. Uma música, um poema, um filme ou um romance finalmente me indicará a direção geral de onde estão enterrados meus pensamentos e sentimentos sobre tudo isso. Quando chegar lá, tenho certeza de que ainda vou ter que cavar um pouco.
Enquanto isso, o planeta continua girando e a vida ainda é misteriosa, poderosa e surpreendente. Ou, como costumava dizer com menos adjetivos e mais poesia, ninguém ensina nada à vida.
Seu filho,
Rodrigo
(Rodrigo García (@rodgarcia59) é produtor e diretor de cinema do filme Four Good Days).

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15 DE MAIO DE 2020

Sextou: funk do coronavírus

De boa

Sem inveja, tá ok? Mas essa é minha realidade na quarentena…

Crédito: Autor Anônimo (Reprodução do Instagram)

Igbo Landing: morte pela liberdade

LUIZ PIEROTTI

Em meio à pandemia da Covid-19, a todas as incertezas, medos e perdas, alguns problemas sociais se evidenciam. Dados do Ministério da Saúde apontam que o risco de morte entre pretos e pardos, no Brasil, é 62% superior aos demais contaminados, porcentagem essa que parece não nos surpreender.

Não há segurança em nossos guetos. Pelo contrário: há desinformação, superlotação e ausência de saneamento. Há abandono e, consequentemente, sentenças de morte. E por que nada disso parece causar espanto aos brasileiros? Pois o preconceito enraizado em nossa sociedade transforma todo genocídio em inevitabilidade.

O caminho e a luta dos pretos sempre foi custosa, trazendo consigo não só o peso das crises que enfrentam, mas também a bagagem da história. Assim sendo, gostaria de compartilhar um fato histórico pouco conhecido pela maioria de nós.

Em 1803, a rebelião de homens cativos na escuna The Schoone York, no litoral da Georgia, se transformaria em um dos maiores atos de liberdade da América. O episódio conhecido como Igbo Landing (Terra Igbo), ocorrido há 217 anos, é um marco profundo na história do movimento afro-americano, expondo a convicção de homens que preferiram a morte à escravidão.

A história é contada no podcast do Caos Cultural, gravado e editado por Luiz Pierotti (sim, o autor deste blog).

Vamos relembrar esse fato histórico tão importante? Então, play!




Aviso aos navegantes

FREDERICO MORIARTY


14 DE MAIO DE 2020

Em quarentena, sob pressão

MARCO MERGUIZZO

 


O cantor americano Brendon Urie se junta ao apresentador Jimmy Fallon e ao grupo musical The Roots, cujos integrantes tocam instrumentos encontrados em casa durante a quarentena, para evocar o distanciamento social em um divertido remix do hit Under Pressure (Sob Pressão), canção celebrizada no início dos anos 80 pela banda Queen e por David Bowie. Bela iniciativa. Bela música. Vale conferir. 


Arteiros da quarentena

MARCO MERGUIZZO

Fotos: Marco Merguizzo e Instagram

Nestes tempos de pandemia do coronavírus, além da rotina do isolamento social e compromissos profissionais at home, há quem também se entregue nas “horas vagas” – e necessite – daqueles momentos para fazer o que bem entender. É o chamado “direito ao ócio”, uma parte restauradora desse duro cotidiano dentro de casa às portas fechadas, que pode ser tanto produtivo e hedonista quanto pra lá de criativo para algumas pessoas.

Pra desestressar e preencher o tempo, portanto, vale desde as atividades mais pragmáticas mas não menos prazerosas como folhear calmamente as páginas de um livro, reler seus autores preferidos ou ouvir a coleção de vinis que você simplesmente ama e ninguém tasca. Ou, relaxadamente, ver na TV filmes, séries, novelas e todo tipo de jogos, como partidas de futebol da quarta divisão da Bielorússia, as de hockey no gelo ou as de curling (a versão sofisticada que os escoceses recriaram do popular jogo de bocha). E, se preferir, até uma disputa de bolinhas de gude.  

E pra driblar a rotina e a melancolia do isolamento, tem marmanjo até indo pra cozinha fazer “pão fitness” (um paradoxo nutricional e gastronômico!), bolo natureba ou arriscando-se a reeditar aquele prato de chef famoso pra impressionar a mulher, namorada, amante e por aí vai. Também há quem, sem grandes dotes culinários, se enfurne no “ateliê” improvisado no fundo da casa (na verdade, o quartinho de despensa meio bagunçado) para dar uma de artista, pintando, esculpindo, moldando, tricoteando e fazendo das suas.

Um desses Picassos anônimos de ocasião surgidos nestes quase dois meses de isolamento, acabou por reproduzir, com clipes de escritório coloridos, o famoso quadro “O Grito” (1893), do pintor norueguês Edvard Munch. A obra representa uma figura andrógina num momento de profunda angústia e desespero existencial. Achei bem legal o resultado e resolvi postar aqui essa criação artística (de autoria desconhecida), ao lado do original, que fica exposto na Galeria Nacional, na capital Oslo.

Visitei o lugar em 2015, numa viagem incrível que eu fiz à Noruega para conhecer o pátria dos vikings, os seus fiordes cenográficos, a aurora boreal e a poderosa indústria pesqueira local, onde se fisga o melhor bacalhau do universo. Registrei essa minha aventura naquele território congelante do Ártico, no blog Aquele Sabor Que Me Emociona, aqui no Coletivo. Clique aqui, caso ainda não tenha lido).  


Triste, amargo, devastado país

CARLOS ARAÚJO

Triste país de identidade desigual mas apenas lamentada, mantida, agravada. Triste país de cores cinzentas, tons em preto e branco, mancha desbotada. Triste país sem história, sem compaixão, sem poesia. Triste país movido a mentira, sabotagem, solidão. Triste país desamparado, à deriva, na contramão do sublime. Triste país massacrado pela tristeza, rendido à desfaçatez, marcado pela tragédia. Triste país sem líderes, sem instituições, órfão de imaginação, vazio de oxigênio. Triste país asfixiado pela falta de ar. Triste país em que a crise política é mais manchete do que o recorde de 881 mortes de Covid-19 em 24 horas. Triste, amargo, devastado país.


13 DE MAIO DE 2020

Ô de casas: som pra alma

MARCO MERGUIZZO

Realizadas desde que começou a quarentena, há quase dois meses, já foram cerca de 50 apresentações. Diariamente, a cantora Mônica Salmaso mesmeriza com sua voz ultraafinada uma legião de fãs e seguidores nas redes sociais – e agora o público que é fã de boa música e está em isolamento social -, através de suas performances no projeto “Ô de casas”.

Com um repertório que inclui bossa nova, MPB e samba de raiz, esta super talentosa meio-soprano paulistana faz, em geral, duetos com músicos de primeiro time do país e do exterior – e detalhe: cada qual na sua casa.

É o caso do violeiro, escritor e exímio contador de causos Paulo Freire (PeÉfê), um ex-jornalista, fã de Guimarães Rosa e pesquisador seríssimo da cultura musical caipira, com quem Mônica forma à distância um duo memorável: ela, em Sampa, ele, em Campinas.

No vídeo abaixo, desfrute do talento de ambos e de “Cuitelinho”, um clássico da moda de viola cuja interpretação encanta e cativa não só os ouvidos mas a alma e o coração.

CUITELINHO

(Tradicional / Adaptação: Paulo Vanzolini)

No Instagram: @_o_de_casas

@monicasalmasooficial @paulofreire.viola

#ficaemcasa


Eu te quero morto

FREDERICO MORIARTY

Entre os 881 mortos de ontem, terça-feira (12/5), havia o choro desesperado da mãe. O lamento da filha que, dias antes, deu seu último beijo no pai e este ouviu o derradeiro “eu te amo”. Uma miríade de rostos sem nomes, corpos sem despedida, almas moribundas. Foi um dia frio, gelado, de perdas e tragédias familiares. Toda dor é infinita. Toda morte tem o silêncio surdo dum parafuso tampando o caixão fúnebre. O horror é de tal dimensão que não se prestam mais homenagens. Os vivos ficam estáticos e resignados frente ao sarcófago lacrado. Antes disso angustiaram-se sem notícias do enfermo tão querido e necessário. É uma morte besta causada pelo invisível. Não há mais os passos tristes do cortejo em direção à cova. Estas estão prontas antes mesmo do último suspiro. E são muitas, como uma imensa escadaria de valas. De sete palmos de fundura.

Catacumbas de São Calixto, em Roma, Itália

Em meio ao tenebroso cenário muitos gritam: levantem seus corpos desfalecidos e ponham-se a trabalhar. Inventam que o fim da vida é uma invenção. Que a dor e a ferida de milhões são uma trava ao capital. Vilipendiam túmulos e cadáveres. Vilipendiam a inteligência, o respeito e a dignidade humana. Nos relembram o quanto abjeto e pérfido pode ser um homem. Nos dão a certeza que numa guerra se vão muitos de nossos melhores soldados e sobrevivem a maioria dos generais hipócritas em suas salas confortáveis e arejadas. Assistindo pelas janelas o sangue jorrar como um rio, enquanto sorvem do mais delicioso vinho e tripudiam do sofrimento alheio.

( o texto abaixo cita o Decameron. Leia em nosso blog um artigo completo sobre o livro de Boccaccio. Clique AQUI )


Jornada I: William Burroughs

LUIZ PIEROTTI

Entre 1348 e 1353, o escritor italiano Giovanni Boccaccio escrevia sua maior obra, o Decameron (do grego “deca hemeron”, ou seja “dez jornadas”), uma coletânea de cem novelas narradas por um grupo de jovens que se abrigavam em uma montanha da Florença, fugindo da peste negra. Suas histórias orbitam o amor, o erótico, o sagaz, o moral e até mesmo o trágico.

Baseado na obra do escritor toscano, e com temperos de pandemia moderna, inicio hoje minha própria jornada.

Jornada será um espaço de compartilhamento de narrativas que me ajudarão, e por que não aos senhores leitores também, nesse difícil processo de travessia crítica que vivemos. A cada post me valerei de um autor diferente para expressar um pouco de nossas próprias descobertas, medos, exaltações e confusos durante o isolamento.

Hoje, o trecho escolhido pertence ao livro “O gato por dentro”, de Williams Burroughs. A obra apresenta todo o processo de convívio do autor com seus gatos, e como essa relação pôs Burroughs em contato consigo mesmo.

Dedico esse pequeno excerto aos amantes de animais, em geral.  

 


12 DE MAIO DE 2020

Vida > Mercado

MARCO MERGUIZZO

Desenho/Crédito: Daniel Kondo

Surreal: salões de beleza, barbeiros e academias estão agora na lista de “serviços “essenciais”. Atenção, senhores deste des(governo): essencial mesmo é preservar vidas do contágio. (Atualizando: em menos de 24h, o STF vetou mais esta medida presidencial. Continua valendo, portanto, a quarentena e as regras de isolamento social). #mantenha-senoisolamento #ficaemcasa


Consumo anarquista

FREDERICO MORIARTY

O que preocupa os grandes varejistas não é ficar tudo parado. Mas o perigo da população perceber que não faz diferença nenhuma viver sem a novíssima caneca de Nova York, que um edredom pode durar anos e uma roupa e só uma roupa. E não vale a pena pagar $$$$$ numa carne amassada num pão. É isso que os assusta: o caráter pedagógico da pandemia em relação ao consumo.

(Leia mais sobre consumo e meio ambiente no artigo do blog do Frederico Moriarty sobre a novela dos anos 70, Sinal de Alerta. Clique aqui)

Frida on-line e museus na faixa

MARCO MERGUIZZO

Não dá pra negar os fatos: a pandemia já mudou atitudes e comportamentos de modo irreversível. Ou seja, não é uma simples “nuvem passageira”, como dizia aquela velha canção de Hermes Aquino. As relações virtuais e não só a nossa vida profissional, com o home-office e as conference calls tornando-se regra no lugar do velho escritório e das reuniões presenciais, assim como os elos sociais, hábitos de consumo, preferências de lazer e programas culturais mudarão irremediavelmente da água pro vinho.

Em minhas viagens e andanças pelo Brasil e mundo afora, seja como jornalista, seja como turista que busca manter permanentemente o olhar curioso de aprendiz, exposições e mostras artísticas estiveram desde sempreem meu radar – uma atitude impensável nestes tempos de isolamento social, já que estamos no olho do furacão da pandemia e muita gente tem “furado” infelizmente, consciente ou inconscientemente, a quarentena.

A abertura de acervos digitais de grandes museus e a realização de exposições virtuais de artistas consagrados com acesso gratuito, neste período de quarentena, têm sido uma bela alternativa para driblar e aplacar essa secura de programas culturais, idas a museus e visitas a galerias de arte – e, melhor, isso tudo na faixa – para a alegria da legião de fãs das artes plásticas.

Caso por exemplo, da pintora arrasa-quarteirões Frida Kahlo, uma das mais importantes e representativas pintoras do surrealismo de todos os tempos. Tracei o perfil dela aqui no meu blog, no Terceira Margem, (clique aqui para dar uma espiadela no artigo). Desde o início de maio, o site da irrequieta artista plástica mexicana passou a disponibilizar o acesso ao universo mágico e intrigante de seu acervo.

Para navegar e curtir as obras que compõem o seu precioso legado, basta clicar no link do Museu Frida Kahlo e aproveitar essa ótima iniciativa, que tem tempo limitado de acesso livre. Vale portanto conferir antes que acabe. Aproveite, ainda pra “passear” por outros museus incríveis com acervos virtuais permanentes abertos ao público e que disponibilizam ferramentas digitais de navegação e interação. Abaixo, algumas sugestões bem legais que valem – e muito – a experiência:

No acervo digital do MASP, ‘A menina com as espigas’, de Renoir (1888)


Síndrome do medo

CARLOS ARAÚJO

Medo de que o número de mortos em 24 horas tenha aumentado hoje em relação a ontem. Medo de não saber como lidar com as emocionantes histórias das vítimas que vão além dos números e aparecem com rostos, planos interrompidos, futuros esvaziados. Medo de não saber até quando vai a contagem dos mortos. Medo de sair do distanciamento social e baixar a guarda no momento errado. Medo de a qualquer instante ser surpreendido no WhatsApp com a notícia da perda de alguém muito querido. Medo de sofrer com novas despedidas de artistas que deixam obras que fazem o mundo ser melhor e que aprendemos a amar como se fossem amigos e parentes próximos. Medo de fazer parte das estatísticas sem nem ao menos conseguir dizer adeus. Medo de não poder respirar. Medo de sentir mais medo a cada manhã de sol, a cada entardecer de outono, a cada noite fria que nos acolhe com a ameaça de ser a última e a esperança de que haverá um novo dia.


11 DE MAIO DE 2020

Digressões do isolamento

MARCO MERGUIZZO


Corona em Sorocaba – Estatísticas

FREDERICO MORIARTY

Um aluno me disse que exagero demais e pediu para eu demostrar que Sorocaba ainda precisa do distanciamento social. Peguei os dados de casos confirmados e mortos da cidade. O de suspeitos permanece entre 141 a 160 nos últimos 9 dias. É precário, feito à mão. Se algum amigo matemático puder fazer um gráfico decente eu agradeço. Nos cinco primeiros dias, o número de mortos subiu uma vez. Ontem, completamos quatro dias seguidos de novas mortes. Em nove dias, elas cresceram 34%. O número de casos confirmados cresceu 87% em maio. Além disso temos 49 internados e dez em UTI. E está só começando por aqui, afinal nosso primeiro caso ocorreu 27 dias depois de Sampa. São 40,9 casos para cada 100 mil habitantes e 4,3 óbitos por 100 mil sorocabanos. Comparando com São Paulo (estamos com grau menor do que a capital ), teríamos 2.200 casos e 120 óbitos no dia 15 de junho (se mantivermos o isolamento acima de 50%). Não dá, portanto, pra relaxar no isolamento.

#ficaemcasa

Gráfico 1

Gráfico 2


10 DE MAIO DE 2020

A mulher carrega o mundo

JOSÉ CARLOS FINEIS

Retirei essa colagem de esculturas e pinturas antigas de um grupo de WhatsApp. A imagem da mulher com o bebê no colo, como se percebe, retrata uma situação universal e talvez seja a que melhor representa visualmente a Humanidade. A mulher com o bebê no colo poderia ser a logomarca da raça humana no Universo.

Há muito observo a força das mulheres, no sentido literal da palavra. Ali na rua Leopoldo Machado onde morei por muitos anos, próximo aos pontos de ônibus das linhas regionais e ao terminal São Paulo, é comum ver mulheres carregando crianças – por vezes, já bem crescidas – com grande esforço físico.

Raramente em toda minha vida vi um homem carregar uma criança na rua, pegar uma fila ou subir num ônibus com uma criança no colo. Quase sempre é a mulher quem leva os filhos para a creche, a escolinha, o posto de saúde. Quando a criança fica cansada, a mulher a carrega, não importando o peso. Simples assim.

E não é verdade que isso ocorre, como ainda se acredita, porque o homem “trabalha fora”. Quase metade dos lares brasileiros é a mulher que sustenta. Ou seja: a mulher trabalha fora, faz as compras, cuida dos filhos e mantém a casa e a roupa limpas, quase sempre com pouca ou nenhuma ajuda do companheiro.

As mulheres carregam a Humanidade no colo desde sempre. Mais do que os homens, são elas que assumem um compromisso com a Vida, por toda a vida. Porque uma coisa é dar presentes para os filhos, publicar fotos com a prole no Facebook. Outra, bem diferente, é levá-los nos braços por longas distâncias.

Queria ter uma foto de uma dessas mulheres anônimas dos pontos de ônibus para juntar a essa bonita galeria de imagens da Antiguidade. Não como homenagem, que seria uma forma de hipocrisia, mas como um pedido de desculpas por não repartirmos com elas sequer a tarefa de carregar nossos filhos.


Sampa azul

FREDERICO MORIARTY

Da feia fumaça que sobe apagando as estrelas… 53° dia de isolamento e o céu de São Paulo trouxe de volta o azul. (Frederico confinado, domingo, 10 de Maio de 2020)


Mãe é mãe sempre

(PESQUISA/ EDIÇÃO: MARCO MERGUIZZO)

Crédito: Daniel Kondo

Crédito: Pelicano

Crédito: Rogério

Crédito: Céllus

Crédito: Céllus

Crédito: Luiz Carlos Fernandes


9 DE MAIO DE 2020

Pânico em mar revolto

CARLOS ARAÚJO

Está cada vez mais difícil dar conta dos acontecimentos. Agora a vida parece mesmo uma tempestade em alto mar. As ondas batem em todos os lados com uma violência cada vez maior. Como se não bastasse o sofrimento da contagem diária de mortos pela Covid-19, a última onda veio com o presidente da República anunciando um churrasco e no dia seguinte se desmentindo com o informe debochado de que o que falou era fake. E como vai ser quando e se ele declarar guerra à Venezuela? Vai brincar com fogo? Depois de mais essa mentira, quem é capaz de acreditar nele? O que será de nós nesse barco sem direção?


Aldir eterno (por Simone)

Fonte: Instagram da artista


Luto pelo Brasil

País chega oficialmente a 10.017 mortos e a 146.894 infectados pela Covid-19. “E daí?”, diz o presidente macabro. Eu me importo. Eu choro. Eu oro. Eu resisto. Vamos todos resistir.

(Marco Meguizzo)

Capa da edição de Maio/2020 da revista Piauí


#BASTA #IMPEACHMENTJÁ #FORABOLSONARO


Vírus-papão

MARCO MERGUIZZO – Se infelizmente ainda não caiu a ficha de alguns, há de outro lado quem aja de forma extremamente responsável, cautelosa e, até, obsessiva em relação aos cuidados que se deve ter – já que são recomendações da OMS -, para evitar a transmissão do coronavírus e assim diminuir os riscos de contaminação e propagação da Covid-19. No vídeo, acima, é possível conferir a hipérbole bem-humorada da paura daqueles que temem contrair o temido vírus, depois de voltar de uma prosaica ida a um supermercado. Esse tipo comportamento seria até engraçado se o momento pelo qual atravessamos não fosse tão grave e aterrador. Mas vale dar uma espiada. #ficaemcasa #nãosaiasemmáscara


8 DE MAIO DE 2020

10 milagres (e micos) da quarentena

MARCO MERGUIZZO

  1. 1) Hoje aqui, em casa, e em muitos lares, marmanjos e machões varrem a casa, tiram pó dos móveis, lavam, passam, varrem o quintal e, crucial nestes tempos atuais de empoderamento feminino, não reclamam! Nem podem, né? Mas ai daqueles que não fizerem direito! Não é mesmo, esposas e mamães?
  2. 2) Mesmo sem ser um grande chef de cozinha, muita gente, assim como este que vos escreve, tem se aventurado e curtido encostar a barriga no fogão, botando literalmente a mão na massa. Mesmo esquecendo de colocar o fermento do pão, trocando o sal pelo açúcar, embatumando o bolo e queimando o feijão. Afinal, ninguém é perfeito e acerta logo nas 100 primeiras vezes.

  • 3) Porém, como ninguém é de ferro, é possível acordar e saltar da cama mais tarde e ficar o dia todo de pijama, com meias, como o Guedes, ou de chinelos (eba!). E, ainda, usar aquela camiseta surrada que a gente jamais joga fora (eba, eba!). Além de não precisar se barbear todo dia (oba!) ou pentear o cabelo (oba, oba!).

  • 4) Diversão na telinha? Novelas do século retrasado ou, pra quem tem TV a cabo, ver pela enésima vez – como se fosse a primeira – Star Wars, Caçadores da Arca Perdida e De Volta Pro Futuro.

  • 5) Para quem curte esportes, não há outra saída senão assistir a TODAS as finais de futebol: Brasileirões, Libertadores e Mundiais passados. Inclusive o chatíssimo 0 a 0 da decisão da Copa de 94. E, de quebra, ouvir de novo o Galvão Bueno berrar. “É tetra! É tetra!”

  • 6) Já na internet, tente não bocejar ou, tarefa impossível, escapar do tsunami de ‘laives’ (a nova modinha digital) de coaches, influencers e especialistas de nulidades, fazendo análises econômicas, de comportamento e consumo na quarentena e projeções (ou seriam chutões?) pós-pandemia.

  • 7) É fã de vinhos e quer descobrir o que significa “beber com os olhos” e “lamber com a testa”? Então, participe de seu quarto, em plena quarentena, ou do seu home-office improvisado, das centenas de “degustações on-line”, encontros e lives com enólogos e sommeliers, e tenha a mesma e exata sensação de estar chupando bala com papel ou de transar com camisinha, como se falava antigamente.

  • 8) Até o final da quarentena prometa de pés juntos ler TODOS os livros que não conseguiu terminar até hoje desde os tempos de ginásio. Já que você se entregou agora, nem precisa dizer sua idade, ok?
  •  
  • 9) Mas milagre, milagre mesmo, é a multiplicação da louça suja na pia pra lavar. Uma pilha imensa de pratos, copos, talheres que parece brotar do nada como num passe de mágica. Haja sabão, detergente e coragem pra encarar, subir e descer essa montanha todo dia. Xô, preguiça!

  1. 10) E, por fim, a torcida para que dois grandes milagres aconteçam: a descoberta de uma vacina pra Covid-19 e Bolsonaro mudo e calado. Ou, melhor, afastado. Não vejo a hora que a quarentena acabe e esse dia chegue logo. Oremos. Enquanto isso não acontece, cuidem-se e permaneçam seguros em casa. Boas vibrações a todos.

A pia abarrotada de louça suja: só um milagre pra fazê-la desaparecer

PAULO BETTI

Minha homenagem ao psiquiatra Antonio Matos Fontana. Ele foi também ator amador e dono do teatro mais aconchegante onde já atuei, o Fantoche, em Sorocaba. Sua atuação como Brutus, em Julio Cesar, de Shakespeare, que eu vi adolescente, ainda ecoa na minha memória. ”O mal que os homens fazem sobrevive a eles; o bem geralmente é sepultado com seus ossos.”
Descanse em paz.

Antonio Matos Fontana e família: parte da história do teatro em Sorocaba


Lavando as mãos

RUBENS NOGUEIRA

É a recomendação do dia. Como uma ordem militar, porque o assunto é da maior seriedade, no mundo inteiro.

Aqui no Ancionato seria dispensável, até porque sempre fez parte da rotina.


Amar o transitório

JOSÉ CARLOS FINEIS

8 de maio de 2020 – Dormi com a TV ligada no Jornal da Globo, tendo por canção de ninar as estatísticas da Covid-19, depois de ver no WhatsApp o arrependimento de Lima Duarte (mais um!) e o piti da Regina Duarte na CNN – o único episódio divertido do dia, embora angustiante em sua torpeza. Acordei pouco depois – como não poderia ser diferente – com câimbra no rosto (algum médico no grupo?) e coração em sobressalto.

Carlos Pena Filho

Envolta pela escuridão e pela sensação de fragilidade que se tornou latente, minha memória foi buscar lá no fundo do baú um poema que li pela primeira vez há mais de 30 anos, num artigo do Geraldo Bonadio (veja só como este mundo é pequeno), meu vizinho aqui no Terceira Margem. Seu autor, o pernambucano Carlos Pena Filho, falecido em 1960, aos 31 anos de idade. Um belo soneto decassílabo que parece ter sido escrito sob medida para a pandemia sanitária, política e moral que vivemos. Aqui vai.

“Quando mais nada resistir que valha
a pena de viver e a dor de amar
e quando nada mais interessar
(nem o torpor do sono que se espalha),

quando, pelo desuso da navalha
a barba livremente caminhar
e até Deus em silêncio se afastar
deixando-te sozinho na batalha

a arquitetar na sombra a despedida
do mundo que te foi contraditório,
lembra-te que afinal te resta a vida

com tudo que é insolvente e provisório
e de que ainda tens uma saída:
entrar no acaso e amar o transitório.”

Carlos Pena Filho, “A Solidão e Sua Porta”, in “Livro Geral” (1959)

 


7 DE MAIO DE 2020

Todos a bordo – Diário de um Pandemônio

JOSÉ FINEIS

Algo assim como o diário de bordo de uma embarcação, em que os tripulantes ou passageiros tenham a liberdade de acrescentar uma página, sempre que sentirem a necessidade de se expressar sobre algum aspecto da realidade exterior ou interior. Assim pretende ser o blog “Todos a Bordo – Diário de um Pandemônio”, produção conjunta dos integrantes de Terceira Margem – Coletivo de Blogueiros Independentes, que estreia nesta quinta-feira, 7 de maio de 2020, depois de um curto e intenso período de maturação. O blog será alimentado diuturnamente com todas as formas possíveis de conteúdos – pequenos artigos ou crônicas, frases, poemas, vídeos, áudios, fotos, links comentados, etc. –, com os quais esperamos capturar, num sentido mais amplo, o estado de espírito de uma espécie acuada e ameaçada, registrado a sangue quente em meio à pandemia e ao isolamento que, no Brasil da crise política, ética e moral, assumem os contornos de um pandemônio.

Tão Somente

LUIZ PIEROTTI

Curta-metragem de 60 segundos sobre os reflexos do isolamento


No meio do caminho (*)

PAULO BETTI

*) Poema de Carlos Drummond de Andrade, publicado pela primeira vez na Revista de Antropofagia, em 1928


Depois da Quarentena

FREDERICO MORIARTY

Saímos da fase 1, a da euforia com o isolamento. Estamos em meio à fase 2: o conflito. Cansamos, mas não temos alternativa. Logo virá a tentativa de equilibrar os opostos. Não posso sair com “Odeio ficar em casa”. Quando as mortes passarem do milhar e a maioria de nós tivermos perdido alguém próximo ou tenha alguém querido em estado grave, entraremos em depressão. Será a fase mais difícil e dolorosa. Será o momento em que estaremos psicologicamente em frangalhos, mas que teremos de ter força para aguentar o tranco e proteger quem estiver por perto e, claro, a nossa própria sanidade. Vencida essa etapa, que espero seja curta e com o mínimo de dor possível, entraremos no estágio final: a de que a quarentena é inexorável mas tem fim. Vamos acordar depois disso num dia frio de outono, céu cinzento, coração marcado. Daremos passos curtos, amedrontados, tímidos. Uma libertação que nos deixará marcas pelo corpo. Um aprendizado que será diferente para cada um de nós, uma dor que só nós saberemos o tamanho. Aos poucos, muito aos poucos, abriremos um sorriso pelas ruas. Reencontraremos nosso pai, nossa mãe, nosso irmão e irmã, nossos filhos, nossos amigos e poderemos abraçá-los longamente, com lágrimas escorrendo pela alma e a sagração da divindade de ainda termos a quem amar e de estarmos ali, vivos e fortalecidos. Exatamente nessa hora, um pássaro irá cantar lá do alto, como sempre o fez, mas como nunca antes sentimos: com a beleza de seu silvo.

Músicos italianos cantam nas janelas (13 de abril de 2020)


Prece com café

MARCO MERGUIZZO

Texto/Foto: Marco Merguizzo


Estamos molhados, cansados, com frio e não sabemos em que direção seguir. Afora isso, não temos por que reclamar: ainda temos o barco, os remos, a força de nossos braços e um oceano de possibilidades. Aos remos, pois. Sem demora!

(José Carlos Fineis, do Blog Conversa de Armazém)

Mulher rema em águas revoltas (ilustração de autor desconhecido)

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