
Olhares procurando lonjuras…
Evandro Affonso Ferreira
Hoje me deu vontade de ler um texto meu, que eu publiquei numa plaquete, cujo título é Levaram tudo dele, inclusive alguns pressentimentos…
Pílula do dia
Perguntas insólitas


Primeiras estórias, de João Guimarães Rosa
Entrevista: Bernardo Ajzenberg

Evandro Affonso Ferreira – Morrer é vislumbrar as profundezas místicas dos fogos-fátuos?
Bernardo Ajzenberg – Morrer é pôr um fim até mesmo nos fogos-fátuos. Não consigo ver nada além do nada.
Evandro – E a solidão? É aquele invisível, ali no canto, carente de apalpamentos?
Bernardo – Bendita solidão. Como te quero bem.

Evandro – É possível farejar as voluptuosidades do eventual, as luxúrias do acaso?
Bernardo – Torçamos para que não predominem no acaso os sofrimentos e as feridas. Seria bom demais.
Evandro – Viver? Você está preparado para esta emboscada?
Bernardo – Definitivamente, não. Mas a gente se vira, empurra com a barriga. O que vier é lucro.
Evandro – Reveses? Enriquecem biografias, empobrecem epitáfios?
Bernardo – Enrijecem a pele, embaçam o olhar, amarelam os dentes, forçam caretas no rosto, tornam-nos mais humildes e fortes.

Evandro – E quando você se sente uma nau desarvorada, barco aturdido nas águas da inquietude, veículo desordenado numa estrada em declive?
Bernardo – Grito, corro, mergulho, choro e escrevo – nessa ordem.
Evandro – Você já aprendeu, com o passar do tempo, a farejar, com antecedência, uma rua sem saída?
Bernardo – Sim. Mas sempre surge um beco que eu não imaginava que fosse beco, muito menos sem saída.
Evandro – Sensação de que sua vida, vez em quando, se parece com uma parábola ininteligível, cheia de não-vereis-não-entendereis?
Bernardo – Muitos pontos obscuros, muitos lábios trêmulos e hesitações. Eu sei que é por isso que escrevo.

Evandro – Eu sinto, você também sente que, às vezes, muitas vezes, carece de passos únicos para caminhar no sentido contrário ao unânime?
Bernardo – Nem sempre me parece meritório andar na contracorrente, mas, quando a gente pega um veio bom, e tem convicção dele, é a plenitude.
Evandro – E esse solene cortejo de incompreensíveis e todos os seus inumeráveis-ininteligíveis apetrechos?
Bernardo – Faz tempo que desisti de lançar luz sobre o incompreensível, porque fracassei em tentar entender muita coisa, principalmente as coisas – ou as pessoas– que tinha certeza de que conhecia muito bem.
Traduções de Bernardo Ajzenberg
Fragmentos
Dizem que guardava num baú invisível uma penca de irrealizações. Contam também que é possível ler em seu túmulo este epitáfio: NÃO DEU TEMPO.
Motejos

Livros de minha autoria
1996 – Bombons Recheados de Cicuta (Paulicéia)
2000 – Grogotó! (Topbooks)
2002 – Araã! (Hedra)
2004 – Erefuê (Editora 34)
2005 – Zaratempô! (Editora 34)
2006 – Catrâmbias! (Editora 34)
2010 – Minha Mãe se Matou sem Dizer Adeus (Record)
2012 – O Mendigo que Sabia de Cor os Adágios de Erasmo de Rotterdam (Record)
2014 – Os Piores Dias de Minha Vida Foram Todos (Record)
2016 – Não Tive Nenhum Prazer em Conhecê-los (Record)
2017 – Nunca Houve tanto Fim como Agora (Record)
2018 – Epigramas Recheados de Cicuta – com Juliano Garcia Pessanha ((Sesi Editora)
2019 – Moça Quase-viva Enrodilhada numa Amoreira Quase-morta (Editora Nós)
2019 – (Plaquetes) – Levaram Tudo dele, Inclusive Alguns Pressentimentos, Certos Seres Chuvosos não Facilitam a Própria Estiagem e Anatomia do Inimaginável.
2020 – Ontologias Mínimas (Editora Faria e Silva)
2021 – Rei Revés (Record)
Foto principal
As fotos que abrem este blog pertencem ao meu futuro livro, Ruínas. Passei um ano fotografando paredes carcomidas pelos becos, veredas, ruas do centro, e de alguns bairros paulistanos.
As imagens apresentam uma concretude pobre e miserável, de ruína mesmo, que na sua própria deterioração encontra rasgos inesperados de um refinado expressionismo abstrato – força das paredes arruinadas e das tintas expressivas do tempo. (Alcir Pécora)
Capa: Marcelo Girard
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