A última crônica de 2021 do Frederico Moriarty…
Dois minutos do dia 30 de dezembro. Uma mulher entra em contato para comprar quatro livros anunciados há tempos no Mercado Livre. A moça estava com pressa e sugeriu que cancelássemos a venda para o motoboy dela buscar no mesmo, afinal pelo ML levaria sete a oito dias pra chegar.
– Tem custo? Perguntei.
– Não.
Cancelei a venda e ela depositou no ato. Com 20 pilas a mais. Meia hora depois um amigo propõe comprar meu último lote de CDs. Despencou o preço, mas aceitei. Agora era dormir e começar bem o penúltimo dia do ano.
Enchi uma caixa com 160 CDs. Desci as escadas com 29kg de mercadorias. Aproveitei para atravessar a cidade e visitar meus pais. No caminho um cidadão me fechou. Buzinei. O cara abriu o vidro e começou a me xingar e culpar. A incapacidade do ser humano em lidar com pequenos entreveros em que a responsabilidade é exclusivamente do acusador impressiona. Do nada, a pessoa transforma tudo em tempestade, ciclone e varre a tudo e a todos, por algo que ela mesmo fez. Narciso hoje passaria fome no Brasil e não encontraria lago à disposição.
Quando parei o carro veio a boa noticia: o ML aceitou o cancelamento da venda dos livros! Com um porém: fui estornado dos valores da venda. Como não havia recebido nada ainda, debitaram do saldo anterior. Mas vão devolver… dia 27 de janeiro!! E descontando a taxa da venda que não vendi. Pior que, em vez de receber 20 pilas a mais, vou receber 40 a menos.
Começou a chover e esqueci o guarda-chuva. Entrei molhado nos meus pais, com a sensação de que não era um bom dia. Fiquei feliz com os dois passarem pelo 94° ano-novo. Conversamos e despedi-me dos dois. Desci para o carro e esperei o motoboy pegar o livro. Resolvida a questão do livro, voltemos aos CDs.
Abri o porta-malas, coloquei a chave do lado. Arrumei os CDs, coloquei um monte de isopor e plásticos para proteger e passei a fita adesiva. Terminado o embrulho, fechei o porta-malas… Pqp!!! A chave do carro estava dentro. De raiva, dei uma bicuda no pneu do carro. Liguei para a espousa:

– Esqueci a chave dentro do carro.
– Onde você está?
– Não frente da minha mãe.
– Vou levar a chave reserva de moto. Espera aí.
– Não precisa. Vou acionar a seguradora. Só que preciso do número de telefone.
– Tá.
– Procura pra mim, por favor.
– Por quê?
– Acabou o plano da Internet.
– Tá b…
Nesse instante acabou a bateria do celular. Bateu o desespero. Pra piorar comecei a lembrar que o porta-malas está quebrado e teria um custo alto pra abrir. Foi-se o dinheiro das duas vendas. Ó céus!! Voltei aos meus pais. Nenhum carregador servia. Agora danou-se. No minuto final, a cuidadora conseguiu achar o telefone da seguradora. Liguei e ouvi: ” tempo de espera para o profissional chegar ao local de 95 minutos”.

Duas horas! Acabou o dia. Despedi-me dos meus pais. Desci o elevador chutando baratas e cobras.
Meditação, Frederico. Meditação e oração sempre te ajudaram. Você relaxou. Pensa no presente, não deixe as atribulações da vida te prejudicarem. Confie em Deus, concentre-se e respire. Foram cinco minutos de paz espiritual.
Continuei a jornada. Parei na portaria e iniciamos uma busca de carregador de celular. De repente éramos cinco pessoas batendo papo sobre futebol, árvores caídas e roubalheiras. Apareceu um carregador. O tempo foi passando com alegria. Meia hora antes chegou o chaveiro.
– Boa tarde senhor. O que aconteceu?
– O esperto aqui fechou o porta-malas com a chave do carro dentro.
– O carro está aberto?
– Está sim.
Entrou no banco de trás. Puxou o mesmo, ele desceu e abriu um vão no porta-malas. O rapaz pôs a mão dentro compartimento e me entregou as chaves. Tudo levou 17 segundos. Virei pra ele e falei :
– Burro duas vezes. De trancar o porta-malas com a chave dentro e outra de não pensar numa solução simples.
Nem esquentei quando atravessei um quarteirão com uma caixa de 29 kg e o Correio negou o envio do ML por excesso de peso.
Duas horas de estresse e sofrimento que seriam resolvidos com serenidade e abaixar o banco de um carro.
Mas quando a gente prefere ser burro o mundo conspira contra nós.

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